sexta-feira, 23 de setembro de 2016

O tamanho da podridão (Editorial do Estadão)


A prisão do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, ainda que apenas por algumas horas, significa que o escândalo da Petrobrás alcançará mais gente e gente muito mais graúda do que os notórios operadores do PT que hoje amargam a prisão. Já se sabia que o propinoduto que ligou a máquina do Estado aos cofres do PT era o pilar de um método de governo, sendo o ex-presidente Lula o “chefe supremo” do esquema de corrupção, como autoridades já denunciaram. Mas as suspeitas que recaem sobre Mantega, se comprovadas, mostrariam a extensão do contágio por grande parte do primeiro escalão da administração, passando o próprio governo a ser visto como uma organização criminosa.

Mais longevo ministro da Fazenda da história brasileira, Mantega tornou-se, ao lado da presidente cassada Dilma Rousseff, o grande símbolo do jeito petista de governar. Enquanto Dilma, em seu dialeto peculiar, agredia a realidade de sua desastrosa administração com frases desconexas, Mantega, sempre com ar professoral, tratava de insultar a inteligência alheia com dados sem sustentação e retórica vazia para comprovar o acerto da famigerada “nova matriz econômica” – aquela que quase quebrou o Brasil. O ministro da Fazenda era a face mais conhecida da impostura do PT na condução da economia, um obediente executor das fantasias nacional-desenvolvimentistas de Dilma. Nada, porém, indicava que ele tivesse feito uso de seu cargo e de seu poder para fazer algo além de destruir as finanças do País.

Tudo isso mudou ontem. O juiz Sergio Moro aceitou pedido do Ministério Público Federal para que Mantega fosse preso, sob acusação de que o petista, em novembro de 2012, quando era ministro, solicitou ao empresário Eike Batista recursos para o pagamento de dívidas de campanha do PT. A informação foi prestada pelo próprio Eike em depoimento ao Ministério Público em maio passado.

Em 2012, o Grupo OSX, de Eike, integrava um consórcio que havia obtido um contrato de US$ 922 milhões com a Petrobrás para a construção de plataformas. Suspeita-se de que Mantega tenha pedido a propina como compensação por esse contrato. Sem experiência na área, o consórcio contemplado não conseguiu entregar as plataformas.

Em seu depoimento, Eike disse que Mantega solicitou R$ 5 milhões para o PT. O dinheiro, depositado no exterior, foi entregue por meio de falsa prestação de serviços pela empresa de João Santana, o marqueteiro do PT. Para Eike, não estava claro que se tratava de uma contrapartida por seu contrato com a Petrobrás, mas não é preciso grande perspicácia para desconfiar dos reais motivos de Mantega – afinal, como disse Eike, “o ministro da Fazenda me pediu, o que é que você faz?”. Além de ministro da Fazenda, Mantega era presidente do Conselho de Administração da Petrobrás.

Eike e Mantega, segundo o depoimento do empresário, trataram a propina como “doação eleitoral”. Em seu despacho, Moro lembra que não cabe a um ministro de Estado “solicitar doações eleitorais ao partido do governo, ainda mais doações sub-reptícias”, feitas “através de contas secretas mantidas no exterior e com simulação de contratos de prestação de serviço, meio bem mais sofisticado do que o usual mesmo para uma doação eleitoral não contabilizada”.

Para Moro, está clara a “similaridade com o modus operandi verificado no esquema criminoso da Petrobrás”. Eis o que realmente importa a essa altura. São muitas as evidências de que o grande sistema de corrupção implantado pelos petistas pode ter tido entre seus operadores o mais importante ministro de Estado tanto de Lula como de Dilma. Terá sobrado um canto que seja de seus governos que não tenha sido conspurcado?

É claro que os petistas, sem ter como defender o ex-ministro, apelam à já tradicional vitimização, pois Mantega foi detido quando estava num hospital acompanhando a mulher, que se tratava. Ao decidir revogar a prisão – pedida porque, segundo os procuradores, havia risco de destruição de provas –, Moro disse que ele, os policiais e o Ministério Público desconheciam a situação familiar do ex-ministro. Mas Lula, sempre ele, já andou dizendo que a prisão de Mantega prova que “qualquer tese de humanitarismo foi jogada no lixo”. Sobre a grave acusação que pesa sobre o ex-ministro, nem um pio.

Audácia do Boff: PT e Dilma sofrem bullying


A loucura humana, de fato, não tem limites. O notório frei Boff acaba de cometer uma das mais absurdas teses sobre os crimes e os criminosos do PT. Estes estariam a sofrer um bullying persistente, como se fossem bodes expiatórios a purgar as culpas que pertencem a todo o Brasil. Quer dizer, Lula, Dilma e mais uma lista de delinquentes cuja enumeração preencheria um daqueles antigos catálogos telefônicos, são doces criaturas que vêm sendo assediadas por gente perversa e pecadora, cujo propósito é encontrar quem pague pelas consequências de anos de corrupção, fraudes e trapaças generalizadas. 

Dilma, Lula e a vasta companheirada não teriam nenhuma culpa ou responsabilidade pelo que aconteceu. Incrível, mas é o que diz o tal teólogo. Frente a tais desvarios dá para entender o "silêncio obsequioso" a que foi condenado pelo papa Bento XVII. Se Boff, no entanto, não pode mais rosnar para dentro da Igreja, poem-se ele absurdamente a cacarejar, impenitente, contra os cidadãos e as instituições democráticas brasileiras. Para que não pairem dúvidas a respeito de suas audaciosas formulações, segue abaixo a íntegra do artigo do bofe:

...............................................................................

A persistência do bullying sobre o Partido dos Trabalhadores e Dilma


"É notório o bullying político e social sofrido persistentemente pelo PT e por Dilma Rousseff. Uma coisa é reconhecer que houve corrupção e erros políticos do PT, e outra coisa é tributar quase exclusivamente tais fatos e a crise atual ao PT e à ex-presidente.

Para entender esse penoso fenômeno, socorre-nos um dos maiores pensadores da atualidade que dedicou grande parte de sua obra a decifrar o que seja a agressividade humana e seus disfarces: René Girard (1923-2015), francês, professor de letras e antropólogo, que viveu nos Estados Unidos. Constata Girard que todos os grupos, e mesmo as sociedades conhecidas, vêm atravessados por tensões e conflitos. O processo civilizatório, a educação, as leis e as religiões propõem um ponto de equilíbrio que permita uma convivência minimamente pacífica ou que impeça que os conflitos não sejam destrutivos.

Mas pode chegar um momento em que os conflitos perdem as rédeas e as forças do negativo vão se acumulando, rompendo o referido equilíbrio. Começam os processos de ruptura nas relações sociais e até nas famílias e entre amigos. O instrumento mais usado é a mídia.

Lentamente, emerge o sentimento de que, assim como se encontra, a sociedade não pode continuar. Ela tem que encontrar um novo equilíbrio. Uma das formas, a mais equivocada e persistente, é a criação de um bode expiatório, que varia consoante as circunstâncias históricas: podem ser os comunistas, os sem-terra, os pobres que ascenderam socialmente, os terroristas, os muçulmanos, as esquerdas e outros.

Em nosso caso, o bode expiatório escolhido foi e continua sendo o PT e a ex-presidente Dilma Rousseff. Toda a raiva e o ódio acumulados são lançados sobre o bode expiatório. Ele carrega todas as maldades e é feito responsável por todos os desmandos ocorridos e pela crise econômico-financeira. Esquecidos ficam, consciente ou inconscientemente, todos os acertos, em especial a maior transformação social pacífica feita em nosso país, que implicou a diminuição de nossa maior vergonha, a desigualdade social e, positivamente, a integração de cerca de 40 milhões de pessoas, sempre consideradas peso morto da história.

Mas há outra função, a de ocultar. Ao colocarem toda culpa e todos os males sobre o PT e a ex-presidente, os grupos dominantes ocultam sua própria perversidade e culpa. Apresentam-se, farisaicamente, como paladinos da moralidade e tomados de indignação contra a corrupção. No entanto, exatamente dentro desses grupos dominantes se encontram os maiores corruptos, corruptores e sonegadores de impostos.

A Bíblia conhece também a figura do bode expiatório, sobre o qual a comunidade colocava todas as ofensas a Javé e o levava para o deserto para lá morrer. O mesmo faziam os gregos, chamando o bode expiatório de “phármacon”, que, como um remédio farmacêutico, purificava a sociedade de seus desacertos. O cristianismo o vê na figura do cordeiro imolado. O efeito é sempre o mesmo: aplacar a sociedade para que, refeita, possa equilibrar seus conflitos, até que estes se agravem novamente e acabem por criar algum outro bode expiatório.
Assim funciona canhestramente nossa história sacrificialista. Girard vê uma saída sensata: na coordenação dos interesses ao redor do bem comum, na total transparência e na inclusão de todos, sem sacrificar ninguém. Mas reconhece que esse não é o caminho seguido pela maioria das sociedades conhecidas. O mais fácil é criar bodes expiatórios, como se pratica atualmente no Brasil. Para a infelicidade geral".  

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Empreiteiros X Políticos: a aventura de Kalil


A reputação dos políticos, sabe-se há muito tempo, não é lá essas coisas. Desse fato se servem demagogos eventuais para alardear suas diferenças em relação a parlamentares que, periodicamente, disputam eleições, tal qual está acontecendo na luta pela prefeitura de Belo Horizonte. Dizendo não serem políticos, fazem o mais político dos discursos políticos. Apontando o dedo podre para os adversários, pretendentes como Kalil, de ofício empreiteiro, querem disputar e vencer os “políticos” nas eleições municipais no corrente ano de 2016. Em São Paulo ocorre algo similar.

A reputação dos empreiteiros, no entanto, não é nenhuma Brastemp, como se diria antigamente. Se os políticos, qual fraldas sujas, podem - e devem - ser removidos periodicamente de suas posições, qual seria a solução adequada para arrostar os empreiteiros malandros? Solução sedutora seria aquela relatada pelo historiador Suetônio em sua obra sobre os Doze Césares. Calígula, um dos mais eficientes imperadores romanos, costumava degolar os empreiteiros que não realizassem a contento as obras contratadas. Verdade que os tempos atuais não permitem práticas tão bárbaras, apesar da simpatia que provocaria nas multidões.

Os casos de imperícia e de trapaças dos empreiteiros são notórios: viadutos que desabam, coberturas de estádios que desmoronam, passarelas arrancadas pelas águas, pistas com cobertura asfáltica que não duram um verão, usinas de energia inadequadas, moradias populares que se esfarelam mesmo antes de qualquer uso, os exemplos são inumeráveis. O passivo da turma capitaneada pela Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e outras menos votadas é considerável.

Agora, o que se observa, porém, é uma articulação dos chamados pequenos e médios empreiteiros contra os grandes do setor, aproveitando a crise pela qual passa o país. Parecem querer inverter o juízo proferido por Diógenes, ao vislumbrar uma comitiva conduzindo um grupo de homens para o cadafalso: “lá vão os ladrões grandes enforcar os ladrões pequenos”. 

Em Belo Horizonte, os empreiteiros pequenos se assanham contra os empreiteiros grandes. A ferramenta que pretendem utilizar nessa disputa de vida ou morte é a prefeitura da capital mineira. Por isso bradam: Kalil para prefeito, em aliança estreita com os maluquinhos da Rede de Marina Silva e os nefelibatas do PV. 

Empreiteiro fabricante de asfalto, Kalil deve ter acenado aos novos aliados com a promessa de tingir de verde - ecologizando, vá lá o neologismo - a pasta asfáltica, dando assim um novo colorido à cidade, sem se esquecer naturalmente dos acertos com os adeptos do arco íris.

Lula faz o diabo para escapar do encontro marcado com Moro (Augusto Nunes)



“Não há no planeta Terra ninguém mais indignado do que eu”, disse Lula ao receber a notícia de que fora transformado em réu da Lava Jato pelo juiz Sérgio Moro. A frase superlativa não surpreendeu o magistrado que comanda a devassa do maior esquema corrupto da história. Ele soube desde sempre com quem estaria lidando, confirma a ressalva incluída no texto que formalizou a aceitação da denúncia do Ministério Público Federal: “… entre os acusados, encontra-se ex-Presidente da República, com o que a propositura da denúncia e o seu recebimento podem dar azo a celeumas de toda a espécie”.

“Celeuma” é pouco para definir o que Lula anda dizendo desde que a distância entre São Bernardo do Campo e a República de Curitiba encurtou dramaticamente. Graças sobretudo à discurseira em resposta aos procuradores federais, ficou claro que há notáveis diferenças entre as reações verbais provocados pelo medo de cadeia ─ cujo sintoma inaugural é a perda da noção do ridículo ─ e as produzidas pelo medo da morte política, escancarado pela perda do que resta do sentimento da vergonha.

Para sobreviver ao escândalo descoberto em 2004, por exemplo, Lula primeiro afirmou que fora traído por amigos jamais identificados, depois jurou que o Mensalão nunca existiu. Sem acreditar numa só palavra do que dizia, avisou que, tão logo deixasse a Presidência, trataria de desvendar pessoalmente a conspiração da elite golpista que tentou derrubar, com a fabricação de roubalheiras imaginárias, o governo que só pensava no povo. Haja sem-vergonhice.

Essa retórica do cinismo deu lugar ao discurso de quem cruzou a fronteira do ridículo, avisa o palavrório despejado pelo palanque ambulante um dia depois da denúncia dos procuradores da Lava Jato. Mais grave ainda, Lula agora acredita no besteirol que improvisa sob salvas de palmas das plateias amestradas. “Acho que só ganha de mim aqui no Brasil Jesus Cristo”, disse o Mestre a seus discípulos no Sermão do Segundo Calvário. Ele ainda enxerga no espelho o campeão de popularidade aposentado pela vaia no Maracanã na abertura do Pan-2007 .

Lula ultrapassou de novo a fronteira do ridículo ao explicar que “a profissão mais honesta é a do político, porque todo ano, por mais ladrão que ele seja, ele tem que ir pra rua e pedir voto”. Para o comandante do Petrolão, portanto, a mais honesta das profissões é exercida por ladrões tão insolentes que pedem votos às vítimas do assalto. Garantida a camisa-de-força, a alma viva mais pura do mundo consolidou a candidatura a orador das turma do hospício com a sopa de letras concebida para provar que só diz a verdade.

“A gente pode mentir pra vocês, a gente pode mentir pra mulher da gente, a gente pode mentir pro presidente do partido, a gente pode mentir pra um companheiro, mas a gente não pode mentir nem pra Deus e nem pra gente mesmo”. Resumo da ópera do desvario: só Deus e Lula sabem a verdade que o mitômano sem cura esconde do resto do mundo. No dia do depoimento à Lava Jato, fará o possível para ocultá-la de Sérgio Moro.


Caso tente escapar da Lava Jato pela trilha desmatada por frases sem pé nem cabeça como as reproduzidas acima, poderá antecipar o acerto de contas com a Justiça. E cumprir mais cedo a promessa de percorrer a pé o caminho da cadeia.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Para onde vão os votos dos petistas?

O PT e o petismo sempre tiveram ao menos uma terça parte do eleitorado de Belo Horizonte. É necessário fazer referência ao petismo (sem vínculo exclusivo com o PT) por uma simples razão. Em outras eleições o partido se revestiu do manto de outras siglas, como é o caso do PSB, mera linha auxiliar histórica do PT, que era reforçado, ainda, pela sopa de letrinhas de outros grupos partidários, como o PC do B, velho serviçal sempre disponível para o que desse e viesse, além de dissidentes fanáticos gerados no mesmo ventre perverso (PSOL, PSTU, Rede etc.).

As últimas pesquisas de opinião na capital mineira apontam que a chapa de candidatos a prefeito e vice - formada respectivamente por dois deputados federais do PT e do PC do B - mal alcança 5% das intenções de voto.  

Ora, onde estão os eleitores petistas que não se dariam a aparecer? Mergulhados em algum  limbo político? Ou estão se encaminhando para alguma candidatura de perfil gelatinoso e pronto para aceitar escolhas de variadas origens políticas e ideológicas, verdadeiro voto útil, capaz de, menos que vencer, infligir uma derrota aos principais e tradicionais adversários, os tucanos?

Kalil, sem dúvida, é o nome do "tapado" como dizem os mexicanos para o verdadeiro candidato oculto do centro de poder. Dentre os demais pretendentes que, talvez, até buscassem criar um cenário que lhes fosse mais favorável, o que parece não ter se configurado até o momento (a quinze dias da eleição), Kalil, o empreiteiro parvenu, corre por fora da raia verbalizando o popular discurso da anti-política, atraindo cada vez mais os votos ressentidos do petismo, agora desamparado de opções orgânicas. 

Assim como Collor fez com as elites políticas brasileiras em outro momento, Kalil se impôs ao governador Pimentel, que ao estilo de Pilatos, lavou as mãos, liberando seus adeptos para fazerem suas escolhas eleitorais. Fragilizado por sua participação nas escandalosas roubalheiras da companheirada, Pimentel sabe, no entanto, que um empreiteiro como prefeito de Belo Horizonte não será obstáculo a um entendimento e a acertos de natureza política e administrativa com o governo estadual. Para o governador, o importante agora é reduzir os danos, optar pelo mal menor. Pimentel circula bem, muito bem, aliás, no ambiente empresarial. Kalil seria um interlocutor bastante satisfatório, caso venha a vencer a disputa, credenciando-se para enfrentar no segundo turno o deputado João Leite, desta feita o real preferido de Aécio, coisa que não o fora nas eleições municipais de 2004. Mas esta é outra história. Os ventos mudam de direção e o secretamente rejeitado de ontem torna-se o desejado de hoje.  


Mitologia (Dora Kramer)

João Santana captou de forma certeira a essência de Luiz Inácio da Silva quando contou como explorou para efeito de propaganda política a dupla personalidade do personagem: o fortão e o fraquinho. Ambos viventes do mesmo corpo entram em cena de acordo com a necessidade.

O forte atua para intimidar e se vangloriar; o fraco para fazer-se de mártir. O primeiro encarna o humilde que virou poderoso contra tudo e contra todos e o segundo faz o papel de vítima das elites, alvo de preconceito de classe, um injustiçado, mas resistente benfeitor dos pobres. Santana revelou o truque ao público há dez anos e até hoje ainda há quem se deixe iludir por essa artimanha.

E não se fala aqui do fiel depositário dos benefícios sociais, que não os vê como direito, mas como concessão paternal. Fala-se das camadas mais informadas, cientes de todos os fatos e atos que revelaram a mentira da bandeira do PT pela ética na política. Caíram no conto quando da condução coercitiva de Lula para depor na Polícia Federal e voltaram a morder a isca quando da denúncia apresentada pela força-tarefa da Lava Jato, na semana passada.

Por ocasião da coercitiva, ato que já havia sido aplicado a vários investigados na operação, Lula encenou o fortão: agressivo, avisou que haviam tentado abater “jararaca”, mas não conseguiram matá-la.

Atingiu o objetivo de inocular desconfiança na atitude dos investigadores que, por essa versão, teriam cometido abusos, exagerado, montado um “circo”. Pois de lá para cá surgiram novos indícios, novas revelações contidas nos depoimentos das delações premiadas, que justificavam o ato. Lula deveria sim ser tratado como vários outros investigados também conduzidos da mesma forma a prestar esclarecimento sem que houvesse reação contra o “absurdo”.

A diferença é que o ex-presidente é o que resta ao PT e, nessa condição, precisa alimentar o mito do intocável. Naquela ocasião, recorreu ao fortão que mete medo. Nessa recente, subiu ao palco o fraquinho que produz necessidade de expiação de culpa e resgate da “dívida social”. Ambos cultivam terreno fértil à semeadura da enganação.

A contundente, adjetivada e detalhada exposição das razões pelas quais foi apresentada a denúncia contra Lula propiciou a propagação da ideia de que os procuradores extrapolaram, produziram um show e nada comprovaram que pudesse corroborar a convicção de que o ex-presidente esteve no topo do esquema de corrupção que sem seu conhecimento não teria como funcionar naquela dimensão.

Fizeram isso de maneira transparente, apresentando as evidências até agora recolhidas, respondendo depois às perguntas dos jornalistas. Obviamente não revelaram tudo. Quando o Ministério Público divulga resultados de investigações é porque detém muito mais informações para respaldar as afirmações.

Já Lula fez as coisas de forma nebulosa. Pronunciou-se sem abordar o mérito das acusações, protegido pelos aplausos da militância reunida no Diretório Nacional do PT. Deu a satisfação que quis, fugindo daquelas que seria instado a dar caso tivesse aberto espaço aos questionamentos da imprensa.

O ex-presidente acusou o golpe recebido com a denúncia. Disse que não estava “entendendo” o que se passava, mas compreendia perfeitamente o que daqui em diante pode lhe acontecer. Fosse de fato inexistente a substância do material na posse do MP, ele teria rebatido ponto a ponto sem o auxílio de recursos histriônicos nem teria precisado sustentar sua diatribe aos procuradores numa mentira: “Não temos provas, mas temos convicção”, a frase de impacto que nunca foi dita.

Lula zombou do Ministério Público sem que isso sirva para ajudá-lo na Justiça. Mas deu motivos aos interessados em atrapalhar as investigações que, não por acaso, lhe deram toda razão.

Pessoas ou anjos (Mariana Moura)

Mariana Moura é candidata a vereadora em Belo Horizonte. A candidata parece se apoiar no famoso conto de Edgar Allan Poe (A carta roubada) para falar do quanto o óbvio é tão evidente que não consegue ser percebido. Seguem abaixo suas considerações:

"A maioria dos políticos brasileiros vive a proclamar – é quase um mantra uníssono, samba de uma nota só – que pretendem obter um mandado popular para poder “cuidar das pessoas”. O mesmo dizem, nas suas propagandas, os bancos, as administradoras de planos de saúde, as fábricas de refrigerantes, as oficinas mecânicas, os supermercados, as concessionárias de serviços públicos e os governantes de qualquer nível, seja local, regional ou nacional. Enfim, todo um vasto conjunto de empreendimentos e instituições proclamando, no período eleitoral principalmente, que busca, nada mais nada menos, que uma oportunidade de cuidar de cada um de nós.


A intenção proclamada, no entanto, costuma guardar enorme distância daquilo que efetivamente é realizado. Os exemplos de tal dissonância são inúmeros; podem ser apreciados em qualquer nível da administração pública: na saúde, na educação e na mobilidade urbana numa constante praticamente universal.

A prefeitura de Belo Horizonte, para focar apenas um único caso, construiu dezenas de estações ao longo das avenidas Antônio Carlos, Pedro I e Cristiano Machado, componentes do sistema  denominado MOVE, com faixas exclusivas de trânsito e pontos roteadores de transbordo. Deixemos de lado eventuais problemas de logística, naturais na sua ocorrência, para ficarmos atentos a um único ponto.

Os inventores do MOVE pensaram que o sistema adotado se destinava a anjos. Anjos, conforme é sabido, não estão submetidos às injunções fisiológicas dos seres humanos normais. Anjos, portanto, não possuem as triviais necessidades que obrigam os homens e mulheres (principalmente estas), de ir, eventualmente, ao banheiro. 

Gastaram uma fortuna para construir uma obra imensa e se esqueceram de “cuidar” dos usuários que buscam se locomover pela cidade. Não levaram em conta que grávidas, idosos, cadeirantes e outros fragilizados fazem xixi e cocô e os bebês precisam trocar as fraldas periodicamente. Mas Belo Horizonte, pelo que se sabe, possui pouquíssimos banheiros públicos decentes (com fraldário, então, nem pensar). 

A prefeitura perdeu, assim, uma ótima oportunidade de matar vários coelhos de uma só cajadada, quando investiu incontáveis milhões no MOVE, imaginando que os usuários seriam anjos que, aliás, quando se deslocam o fazem pelo ar, voando. Não precisam do MOVE nem do metrô. Tal desleixo arrogante atinge, em especial, as mulheres. Os homens, dada sua anatomia, podem com menores riscos lançar mão dos banheiros infectos dos botequins espalhados pela cidade.

A pergunta óbvia que não quer calar é: onde estão aqueles que alardeiam querer “cuidar” das pessoas? Os que se querem nossos cuidadores não têm uma resposta para questões tão singelas e úteis. O código de posturas urbanas de Belo Horizonte não poderia prever a obrigatoriedade de existência de banheiros públicos, em todas as estações de embarque e desembarque de passageiros?" 

    


Transtorno psiquiátrico e benefício para o paciente (Luis Augusto Rohde)


No nosso imaginário coletivo, doença mental está fortemente ligada a sofrimento, perdas em diversas áreas da vida, estigma e preconceito. Nada mais previsível, considerando o seu efeito devastador na vida de muitos portadores, de suas famílias e o abandono da saúde mental nas políticas públicas no país.

Mas será que pode existir algo bom por trás desse cenário tão negativo? E mais importante, quais fatores podem polinizar tais aspectos positivos?

Estudos mostram que indivíduos com transtorno de humor bipolar na idade adulta podem ter uma capacidade de inteligência na infância maior do que a média da população. De longa data, reconhece-se que algumas crianças com transtorno do espectro autista podem ter capacidades perceptivas muito diferenciadas. Situação semelhante ocorre com outras doenças.

Uma estrela da natação é prova disso. Não se preocupe, vamos passar longe do já batido triste episódio protagonizado pelo nadador Ryan Lochte. Vamos nos concentrar no ultracampeão Michael Phelps. Revisitando a sua história de vida, encontra-se um jovem inquieto, desatento e com problemas escolares na infância que levaram ao diagnóstico de transtorno de déficit de atenção/Hiperatividade (TDAH) aos 9 anos e ao uso de medicação para o transtorno até os 12 anos. Sim, ele usou a tão controversa medicação estimulante!

O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento associado à imaturidade do funcionamento de algumas áreas cerebrais. O quadro se caracteriza por um padrão de comportamento em que sintomas isolados ou combinados de desatenção, hiperatividade e impulsividade dominam o dia a dia do indivíduo, principalmente em atividades pouco empolgantes. A doença acomete cerca de 5% das crianças e adolescentes e 2,5% dos adultos. Como uma pessoa com essas características pode ter o foco e persistência para arrebatar 28 medalhas olímpicas?

Deixando de lado a condição física privilegiada para o esporte em questão, Phelps tem algumas características comuns em pacientes com TDAH. Tais características, quando bem canalizadas e trabalhadas, podem ser muito benéficas. Uma energia impressionante e capacidade para “hiperfoco” em atividades que motivam seu interesse. Aliás, isso, muitas vezes, leva os familiares e profissionais a creditarem o problema erroneamente apenas a preguiça e desmotivação.

No caso de Phelps, somado a esses fatores, existe o elemento polinizador final: a ação incansável da mãe, Debbie Phelps, estruturando, organizando, planejando os passos junto com o filho. Funcionando quase como, nas palavras do professor Paulo Matos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, um lobo frontal acessório enquanto tal região cerebral ainda está imatura.

Outros estudos têm surgido recentemente na mesma direção. Um deles sugere, por exemplo, que algumas características do TDAH possam ser valiosas para o empreendedorismo. Assim, um grau controlado de impulsividade pode ser crucial para a disposição de correr algum risco, característica essencial de um bom empreendedor.

Vale, portanto, reservar espaço para aquilatar forças e potencialidades dos nossos pacientes em qualquer avaliação clínica cuidadosa. Quem sabe uma nova medalha olímpica possa vir também de outro tipo de condição potencialmente adversa, diferente daquela enfrentada por Rafaela Silva, nosso ouro olímpico no judô!


Partido do "fora Temer" (Estadão)

O partido do “Fora Temer” é uma agremiação inventada pelos oportunistas do PT para congregar todos aqueles que, como consequência do impeachment da presidente Dilma Rousseff, ou perderam a boquinha de que desfrutavam no governo federal ou precisam desesperadamente de uma boia política, por mais furada que seja, para sobreviver ao naufrágio petista.

No primeiro time estão os grupelhos que, apresentando-se como “movimentos sociais”, recebiam fartas verbas públicas para fazer a defesa violenta do governo petista. Destacam-se, nessa turma, o notório Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e seu subproduto urbano, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). São eles que, junto com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), estão na vanguarda das manifestações que vêm infernizando a vida dos brasileiros a título de exigir a saída do presidente Michel Temer.

No segundo grupo aparecem os políticos petistas que, aflitos, temiam ficar sem discurso na campanha eleitoral, já que o PT, antes um trunfo eleitoral, se tornou um fardo. As pesquisas de intenção de voto mostram esse peso morto: os candidatos petistas perdem em quase todas as cidades importantes, e de maneira acachapante. Além das agruras de Haddad em São Paulo, a tigrada está em maus lençóis em Belo Horizonte, no Rio de Janeiro, no Recife e até mesmo em Porto Alegre, seu tradicional reduto.

Isso explica por que, de uma hora para outra, a campanha de Haddad deixou de lado qualquer discussão séria sobre a cidade que ele administra de forma tão amadora e passou a vincular os adversários do prefeito ao tal “golpe” que os petistas vivem a denunciar. Foi Lula, em recente comício com seu afilhado, quem deu a senha: “O Doria, a Marta e o Russomanno representam exatamente aqueles parlamentares que deram o golpe na Dilma”. Tanto Lula como Haddad estavam usando no paletó um adesivo em que se lia “Fora Temer, Fica Haddad” – sem nenhuma menção ao PT.

Assim, o “Fora Temer” foi formalizado como o “partido” dessa turma, inclusive no material de campanha. Mas, como tudo o que envolve Lula e seus sequazes, o “Fora Temer” é apenas uma palavra de ordem. É um grito vazio, irresponsável, antidemocrático. Se a reivindicação desse pessoal fosse o retorno de Dilma Rousseff à Presidência, ainda haveria nisso alguma dose de racionalidade política. Mas nem os próprios petistas – Lula à frente – querem saber de Dilma, cuja desastrosa gestão foi em parte responsável pela formidável debacle do PT.

A reivindicação de que Michel Temer deixe o governo, sem mais nem menos, e que se convoquem novas eleições diretas para presidente, sabe-se lá com base em que legislação, somente se presta a fornecer aos petistas algum discurso que lhes permita evitar a discussão de temas mais constrangedores, como a corrupção envolvendo vários de seus principais dirigentes e o amadorismo gerencial de Haddad, Dilma e outros pupilos de Lula. Felizmente, a despeito do apoio que o partido do “Fora Temer” conseguiu amealhar entre alguns incautos, parece claro que a essa associação de intrujões está reservado, nas urnas, o profundo desprezo da maioria dos brasileiros.