Um caso ou outro poderia ser acidente. Mas os maus negócios dos
bancos, a queima de recursos das fundações, a devastação das grandes estatais e
a crise da Oi, sem condições de pagar R$ 65,4 bilhões de dívidas, trazem as
marcas de um estilo de governo. Esse estilo foi implantado em 2003 e só
interrompido, por enquanto provisoriamente, em abril deste ano. O escândalo do
crédito consignado apenas acrescentou um toque de perversidade, um tempero
especial, a uma longa história de bandalheiras.
Os R$ 23,1 bilhões perdidos pela
Petros podem ser uma cifra assustadora, mas esse valor parece até modesto
quando se pensa no balanço da Oi. A quebra, ou quase quebra, da operadora
estabeleceu um recorde. Nenhum outro processo de recuperação judicial havia
envolvido tanto dinheiro. Mas outros detalhes também tornam especial esse
episódio. A Oi, uma das maiores empresas de telecomunicação do Brasil, é uma
das mais discutíveis criações do governo petista.
O toque final de sua constituição
dependeu de uma alteração legal promovida pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. Formatada para ser a grande companhia nacional do setor, capaz de
enfrentar as multinacionais, essa operadora resultou em mais um fracasso, mais
uma prova contra a política de criação de campeãs nacionais. Uma de suas poucas
realizações notáveis foi a instalação de uma antena ao lado do sítio do
ex-presidente Lula.
A nova ação da Polícia Federal,
com prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, condução de seu colega Carlos Gabas e
visita à sede do PT em São Paulo, foi classificada por aliados da presidente
Dilma Rousseff como tentativa de reforçar o processo de impeachment. A manobra
seria destinada, além disso, a desviar a atenção das acusações a membros do
governo provisório. Alegações como essas poderiam ter alguma respeitabilidade
em outras circunstâncias. Mas é impossível, agora, levá-las a sério. Afinal, a
Operação Custo Brasil, mais um desdobramento da Operação Lava Jato, só
escancara mais detalhes de uma enorme sequência de crimes.
Alguns desses novos detalhes,
como o desvio de dinheiro de clientes do crédito consignado, funcionários
ativos e aposentados, são especialmente hediondos. Mas, além de mais escabrosos
que outros, podem ser especialmente informativos. A denúncia vai além do
assalto e aponta o PT como um dos beneficiários do dinheiro subtraído.
Cada novo capítulo da Operação
Lava Jato confirma os vínculos entre aparelhamento, loteamento e corrupção nos
governos entre 2013 e meados de abril de 2016. Esses governos foram guiados
essencialmente por um projeto de poder. Todo o discurso a respeito de planos de
integração social e de mudança econômica nunca foi mais que um esforço de
construção de imagem. Esse esforço pode ter enganado parte do público
brasileiro e, com certeza, uma parte considerável do público estrangeiro. Mas a
chamada política social do PT foi principalmente um instrumento de
dominação, baseado muito mais na transferência de renda – um mecanismo de fácil
manejo – do que na efetiva absorção dos pobres na economia moderna. Sem as
transferências, a maior parte das famílias provavelmente voltaria às condições
miseráveis.
Os aumentos do salário mínimo
superiores aos ganhos de produtividade também proporcionaram alguma melhora do
consumo, mas políticas desse tipo são insustentáveis. Depois de algum tempo, a
inflação tende a anular seus efeitos.
Além disso, nenhuma economia
administrada sem disciplina fiscal, uso criterioso de recursos e atenção ao
investimento e à produtividade vai muito longe. A recessão brasileira, com mais
de 11 milhões de desempregados, é mais uma prova dessa obviedade ignorada pelos
petistas – principalmente pela presidente Dilma Rousseff e por seus
incompetentes favoritos.
Não há como fixar uma linha
divisória entre o estilo de ocupação do governo – aparelhamento, loteamento e
apropriação partidária do Estado – e o desastre econômico. A mediocridade do
primeiro mandato, com crescimento médio anual de apenas 2,1%, foi um claro
prenúncio da recessão. Em 2014 a economia, já atolada na crise, cresceu 0,1%,
enquanto a inflação bateu em 10,67%. A piora do quadro a partir daí foi um
desdobramento normal, até porque a presidente rejeitou os esforços do ministro
Joaquim Levy de reconhecer e enfrentar os problemas.
Quem vincula a Operação Custo Brasil ao processo
de impeachment acerta, no entanto, pelo menos num ponto. Há um parentesco
indisfarçável entre o projeto de poder do PT, os desmandos na administração
direta e indireta, a desastrosa política econômica e as pedaladas fiscais. São
estas, formalmente, a base do processo de impeachment. Mas só com muito esforço
de abstração é possível separá-las do resto. O resto inclui, entre outros
detalhes, o desemprego de mais de 11 milhões e o assalto aos velhinhos do
crédito consignado. Esse jogo político é indivisível.