terça-feira, 11 de março de 2008

LULA TREMEU

Ao puxar as orelhas do Congresso Nacional por não ter ainda votado o orçamento da República, Luiz Inácio se traiu no arroubo inusitado. Disse que os parlamentares deveriam deixar a preguiça de lado e ser como ele: “será que só eu quero trabalhar no Brasil?”, indagou sem enrubescer. Sua fala, no entanto, e todos que a ouviram de viva voz podem confirmar, tremeu de maneira quase imperceptível. Neste momento, a alma profunda presidencial, de uma certa forma, falou mais alto. Falsidades costumam se revelar em palpitações, tremores, suadeiras, esquecimentos, atos falhos etc. Mesmo o mais contumaz e mais hábil dos mentirosos não está imune a estas manifestações incontroláveis do inconsciente. Pois desde quando Lula tem apreço ao trabalho? Sua proclamação parece, mesmo, ser mais uma piada de seu inesgotável estoque. Uma inspeção em sua agenda diária, semanal, mensal ou anual, mostrará que seu tempo é gasto mais em perambular pelos quatro cantos do mundo, que em se devotar à resolução dos complexos desafios que avassalam a nação. Sua mesa de trabalho (?) que aparece nas imagens dos jornais e das TVs é de uma limpeza hospitalar e de um vazio extraordinário. Nenhum papel jaz sobre ela. Nada de processos volumosos, nada de relatórios, nada que lembre vagamente o que seja em termos de devoção ao estudo e à reflexão. Seu negócio é pegar o avião e viajar por aí, vadiando neste mundão de Deus como alma penada. Onde houver um palanque lá está ele, vociferante, quase apoplético. Se não houver palanque, constrói-se um imediatamente. Em negócio de palanque, há de se reconhecer, aliás, ele é profissional. São décadas de falatório compulsivo. Não há um dia, um mísero dia que seja, que a criatura não faça um discurso. Talvez pense, vá lá, que não pode nos privar do deleite de ouvir sua voz acatarrada e rascante onde a banalidade e a grosseria fincaram praça eterna. É uma maneira estranhamente absurda de querer agradar aos outros. Muitos dispensariam o agrado torcendo para que o silencio presidencial fosse mais praticado.

SANCHO PANZA

Sancho Panza, o vilão de “pouco sal na moleira” no dizer de Cervantes, costuma ser visto como a representação do homem realista. Aquele que está sempre com os pés no chão, ao contrário do engenhoso fidalgo Dom Quixote de La Mancha, delirante e sonhador a ponto de confundir moinhos de vento com ferozes dragões. Saudosos desenhos animados também faziam uso deste arquétipo. .Mas neste caso a divisão era entre otimistas (Lipy, o leão), e os incuráveis pessimistas (Hardy, a hiena). Quem não se lembra da conclamação de Lipy – “vamos, Hardy, eu sei que vai dar certo”, e a resposta amarga da hiena – “Oh! Dia, Oh! Azar; não vai dar certo, Lipy, eu sei que não vai?” Na atualidade, contudo, as diferenças não são mais estabelecidas entre essas velhas categorias – dos otimistas e sonhadores contra os pessimistas sempre tão realistas. Agora o corte se faz entre os espertos que levam vantagem em tudo versus os tolinhos que nada sabem dos mistérios do mundo.

Tolinhos são aqueles para os quais preto é preto e branco é branco, ou bandido é bandido e polícia é polícia. Quando essas categorias se misturam há um curto circuito na cabeça dessas pessoas. Os espertos, ao contrário, possuem um grande jogo de cintura. Espertos, por exemplo, são os políticos mineiros para os quais haveria uma infinita gradação entre o preto e o branco, e inumeráveis situações onde o que é banditismo pode muito bem estar próximo da suprema honestidade. Os tolinhos não pensam nem agem dessa forma sofisticada. Tolinhos acreditam que quem traiu uma vez será sempre traidor. Uma convivência amena, caso acontecesse, entre Tiradentes e Silvério dos Reis, após a delação do primeiro pelo segundo, seria sinceramente incompreensível. Da mesma forma soa estranha uma parceria entre os que pregam a honestidade e lisura com notórios e refinados corruptos. Tolinhos, coitados, acreditam que quem com porcos se mistura farelos come, e que, quando gente decente aceita conviver com patifes, há um benefício para estes últimos ao preço da desmoralização dos primeiros. Os espertos do PT e outros partidos que estão a ensaiar rendosa sociedade nas próximas eleições, talvez se deparem com uma reação nossa, os tolinhos de BH. Esta aliança pode se transformar no beijo da morte para os espertos.