quinta-feira, 16 de junho de 2016

Antipolítica das elites! Uma falsa solução (Cesar Maia)



1. A tramitação da lei que proíbe nomeações políticas nas empresas estatais trouxe de volta –e de forma tão discreta quanto sofisticada- a antiga tese que a salvação do país está num governo técnico suprapartidário.
               
2. A antipolítica não é só uma reação populista que alcança os setores populares e parte dos setores médios. Alcança, no Brasil, todos os andares sociais, da portaria à cobertura. A ideia que opiniões e indicações de políticos fazem mal ao país é sintoma disso.
                
3. A vontade da elite empresarial é que o governo fosse formado por tecnocratas imunes à política. É provável que se aprove uma lei impedindo indicações políticas para as diretorias das empresas estatais. Afirmam –e a imprensa repercute- que o governo deve buscar no “mercado” os nomes para essas posições.
                
4. Deveriam se perguntar: quantas pessoas no “mercado”, sem filiação partidária nem envolvimento político, estariam dispostas a aceitar um cargo? Milhares, claro. E dois meses depois estariam fazendo sem pejo –e no início com discrição- essa mesma articulação.
                
5. As estatais privatizadas como as telefônicas, a Vale do Rio Doce, distribuidoras de energia elétrica, rodovias, portos, aeroportos, etc., deixaram de fazer a interlocução e ter influência política? Tem, tanto nas diretorias, como –o que é mais grave- nos negócios dessas empresas, indicando fornecedores e se articulando com os governos nos três níveis.
                
6. O que essas elites “suprapartidárias” deveriam entender é que não há solução tecnocrática e apenas econômica para a crise. Afinal, o czar da política econômica –ministro Henrique Meirelles- havia se aposentado do Banco de Boston e conseguido uma vaga artificial, mudando seu domicílio eleitoral, para ser deputado por Goiás pelo PSDB. E recentemente se filiou ao PSD com suas ambições políticas estimuladas. Tudo bem, nenhum pecado. Mas é hipocrisia negar a política como solução.
                
7. Será que essa elite “suprapartidária” imagina que o governo Temer terá continuidade e que as leis que “tanto o Brasil precisa” serão concluídas a golpes de racionalidade tecnocrática? O sistema eleitoral do Brasil é proporcional aberto, estimulando a representação de corporações e das demandas capilares do país. Nesse sentido, são bem mais que 28 os partidos na Câmara de Deputados. Como se costura maiorias nesse quadro?
                
8. A crise política se resolve pela política. Se o sistema eleitoral atual conduz a esta situação indesejada, a prioridade “econômica” deveria ser a reforma política e não ingenuamente construindo um governo de técnicos. Se a política é uma arte, ninguém melhor que o atual presidente Michel Temer para a articulação dessa transição. 
               
9. E nesses 30 dias mostrou que vai bem ao conduzir um navio viking de remadores –com remadas descoordenadas- oscilando, mas apontando para o norte certo, sem perder o rumo, como ocorreu com a presidentA anterior.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Ideia delirante (Estadão)


Dilma Rousseff está cada vez mais perdida em seus devaneios. Percebendo que a versão de que é vítima de um “golpe” não colou, a presidente afastada investe agora numa tentativa desesperada de reverter no Senado a clara tendência pela decretação de seu impeachment. Está propondo uma ideia estapafúrdia: se for reconduzida ao Planalto, convocará um plebiscito sobre a antecipação da eleição presidencial. Aprovada nas urnas a tese da eleição, renunciará. E um novo presidente da República – ou uma nova presidente, sabe-se lá – se encarregará, com a legitimidade que ela acusa Michel Temer de não ter, de concluir o mandato.

A ideia de promover eleições, especialmente quando o País está mergulhado numa crise geral, tem algum apelo popular. Principalmente se for apresentada como um ato de generoso desprendimento por parte de uma mulher que se apresenta como injustiçada por seus inimigos, mas disposta a entregar nas mãos do povo os destinos do País.

A eleição presidencial antecipada já está prevista na Constituição, se ocorrer a vacância dos cargos de presidente e vice-presidente. Se essa vacância ocorrer nos dois primeiros anos do mandato – no caso, até 31 de dezembro próximo – será automaticamente convocada nova eleição, para presidente e vice, “noventa dias depois de aberta a última vaga”, segundo o artigo 81 da Constituição. Acontecendo a vacância dupla a partir do início do segundo ano de mandato, a eleição se dá indiretamente, pelo Congresso Nacional, em 30 dias.

Para que haja eleição direta como propõe Dilma – mas não como ela necessariamente quer –, é preciso que não haja presidente nem vice-presidente. Como não passa pela cabeça de Michel Temer renunciar à Vice-Presidência, as coisas são menos simples do que Dilma expõe. Ela também se diz disposta a “convocar” a consulta popular, mas essa prerrogativa é exclusiva do Congresso, a partir de qualquer uma de suas duas Casas, como estabelece o artigo 14 da Constituição Federal. O que significa que, se está falando sério, Dilma terá primeiro que convencer os senadores ou os deputados a aprovar a convocação do plebiscito, o que tem de ser feito por pelo menos um terço dos deputados ou senadores.

Enquanto exercia a Presidência, principalmente a partir do início do segundo mandato, Dilma sempre teve enorme dificuldade para fazer passar no Congresso propostas em que tinha interesse. Nada leva a crer que será diferente na hipótese remota em que ela acabe sendo reconduzida ao Planalto. Estariam os parlamentares interessados em eleição presidencial antecipada?

Michel Temer exerce a Presidência, substituindo a presidente afastada de acordo com o que estabelece a Constituição. Não tem nenhuma razão para renunciar. Assim, a eleição antecipada que Dilma afirma desejar só será possível se aprovada por um plebiscito que não se limitaria a convocar a consulta, mas também declararia a vacância dupla – o que seria, na verdade, a cassação do mandato do vice-presidente. Em resumo, o golpe imaginário, de que Dilma se queixa de ser vítima, seria aplicado, de verdade, em Michel Temer.

Assim, mesmo que Dilma esteja realmente disposta a cumprir o que promete – convencer o Congresso a convocar o plebiscito e, aprovada a eleição antecipada, renunciar à Presidência –, a viabilidade prática dessa ideia é, no mínimo, extremamente duvidosa. Se o julgamento final do processo de impeachment pelo Senado for realizado, como está previsto, em agosto, restarão menos de cinco meses para que – com uma eleição municipal prevista para outubro – sejam realizados ainda este ano, primeiro, o plebiscito e, em seguida, se for o caso, a eleição para escolher quem concluirá os dois anos de mandato que Dilma ainda teria. De quebra, teria que ser resolvido o problema de saber quem ocupará a Presidência da República no meio tempo entre a renúncia da desprendida Rousseff e a posse do novo chefe de Estado. O presidente da Câmara dos Deputados, seja ele Eduardo Cunha, seja Waldir Maranhão? Arre!