quinta-feira, 23 de abril de 2009

Biodiesel social ainda precisa de investimento para decolar

"Usina recém-criada ainda depende da agricultura empresarial
(Helenice Laguardia)

A conta da Usina de Biodiesel Darcy Ribeiro, em Montes Claros, inaugurada pela Petrobras no início de abril, vai para o bolso do contribuinte, por enquanto. "Vamos precisar de outros investimentos, como correção de solo, semente, maquinário, esmagadora e descascadora. Precisamos dar condições a pequenos produtores para a usina não virar um elefante branco definitivo", admitiu o delegado federal do Ministério do Desenvolvimento Agrário em Minas Gerais, o ex-deputado estadual petista Rogério Correia. Em parte desse investimento, haverá participação do governo federal.O gerente de suprimentos da usina, Onésimo Azeredo, endossou o caráter social da usina. "Só vamos comprar grãos de pequenos agricultores cadastrados no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) com renda de até R$ 115 mil por ano", explicou. A área de atuação da usina será num raio de 300 km de Montes Claros, que inclui 126 cidades. A Petrobras se comprometeu a doar as sementes de girassol e mamona e também assistência técnica com, no mínimo, três visitas por propriedade, além de sacaria para embalagem da produção e transporte para os armazéns da usina. "

Mas e o adubo para correção do solo?", questiona o professor Antônio Machado, especialista em biodiesel. Na prática, a usina ainda depende da produção da agricultura empresarial. "O óleo de soja é comprado em Goiás por R$ 2 o metro cúbico de 1.000 litros, com repasse do ICMS", confirmou Onésimo Azeredo. "Para extrair o óleo de qualquer semente, ou usa prensa mecânica, que nunca retira tudo, ou usa solvente, o hexana, para capturar todo o óleo. Mas aí tem que fazer outra usina, o investimento é muito grande", detalhou o professor. É mais um complicador na recém-criada usina. "Se você não extrair todo o óleo da semente, a torta (sobra) vai ficar rançosa, não serve para ração animal ou bife de soja e biscoitos. O produtor deixará de receber 17% do óleo", calculou Antônio Machado.

A Petrobras ainda não decidiu qual tipo de esmagadora vai utilizar. Outra reclamação do professor refere-se ao contrato de aquisição, com garantia de preço mínimo pelos próximos cinco anos. "As culturas da mamona e girassol são anuais, e a macaúba leva sete anos. Montar a indústria demora um ano, mas para produzir a matéria-prima a história é outra", criticou.

Reunião amplia discussão do biodiesel em Montes Claros

Representantes de 26 entidades envolvidas no plantio da matéria-prima, financiamento e comercialização do biodiesel foram chamados para participar hoje, em Montes Claros, de reunião com integrantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário.A intenção é debater a proposta de polos da Organização Produtiva de Oleaginosas da Agricultura Familiar do Norte de Minas Gerais para atender à usina de biodiesel da Petrobras, inaugurada este mês. Será assinado protocolo de intenções entre a Coordenação de Biocombustíveis do ministério, Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais e a Secretaria de Estado para o Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha, Mucuri, São Mateus e do Norte de Minas Gerais.

Incorporar os pobres

Nascido em Teófilo Otoni, o ex-secretário Especial de Direitos Humanos e atual presidente da Fundação Perseu Abramo, Nilmário Miranda, acompanhou o projeto em Montes Claros ainda na semente. "Estou otimista com o biodiesel pelo que ele representa a longo prazo, na substituição de combustível fóssil por outro renovável", argumentou. Em 2005, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou o investimento em Montes Claros, quando lá esteve para inaugurar uma farmácia popular. "Se hoje está caro produzir o biodiesel, a gente vai desistir? A gente tem que pensar a longo prazo. Incorporar os pobres", defendeu o projeto. "Há 12 anos percorro a região. A usina vai aglutinar renda, plantio. É um investimento barato para a dimensão social que ele tem", compara o belo-horizontino Rogério Correia, que espera a produção familiar num médio prazo. "Mais três safras e estaremos com produção", garantiu. Nilmário Miranda confirma a prioridade do projeto na pauta do presidente. "O Lula visitava o Norte de Minas e o Jequitinhonha quando nem sonhava em ser presidente. Ele sempre prometeu que, se um dia chegasse ao poder, ia mudar a estrutura dessas regiões. Sair do subdesenvolvimento crônico", profetizou o amigo do presidente. "

Publicado em: 22/04/2009 - jornal O Tempo