quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A turma do mensalão (destaque: Márcio Lacerda)

Os ladrões de dinheiro público constam na lista abaixo. Entre eles destacam-se o atual candidato a prefeito de Belo Horizonte - Márcio Lacerda - e o Assessor Especial do prefeito Fernando Pimentel - Rodrigo Barroso Fernandes (um dos articuladores financeiros da campanha de Pimentel em 2004 e ex-secretário municipal da Cultura, afastado e nomeado assessor especial quando o escândalo veio à tona). A presença de gente do PSDB (Paulo Menicucci, por exemplo, que foi tesoureiro da campanha de João Leite, em 2004, por expressa indicação de Aécio Neves), e do PT, além de outros próceres dos partidos que compõem a formidável "ALIANÇA" urdida por Aécio e Pimentel (Romeu Queiroz, do PTB, por exemplo), só comprova o velho dito popular: Deus os fez e o diabo os ajuntou. Cruz Credo. Em suma, a turma de petecanos sempre comeu e bebeu no mesmo cocho. Esta união em torno do Márcio Lacerda poderia ser enquadrada no código penal pela evidente formação de quadrilha. A saída de Márcio Lacerda do governo Lula foi decorrência deste escândalo e, não, por alguma razão maior ou defensável eticamente. Saiu do ministério (onde coordenava a transposição do rio São Francisco), mas encontrou braços compreensivos de volta a Minas Gerais, onde chegou com o rabo entre as pernas por ter sido pegado em flagrante.


"SENADO FEDERAL/SECRETARIA DE COMISSÕES/Secretaria de Apoio às Comissões Especiais e Parlamentares de Inquérito

Presidente: Senador Delcídio AmaralVice-Presidente: Deputado Asdrubal BentesRelator: Deputado Osmar Serraglio Sub-Relator: Deputado Gustavo Fruet

Relatório Parcial sobre Movimentação FinanceiraRelatório parcial da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada pelo Requerimento nº 3, de 2005-CN, para investigar as causas e as conseqüências das denúncias e atos delituosos praticados por agentes públicos nos Correios e Telégrafos.

3.3 Beneficiários dos Recursos da conta 2595-2 - Agência 009 - Banco Rural

3.3.1 Relacionados aos cruzamentos da contabilidade da SMP&B com as informações bancárias. Menciona-se os nomes dos favorecidos e os valores recebidos, que resultaram do cruzamento das informações contábeis da SMP&B com as informações bancárias disponíveis na CPMI.

Favorecidos e Valores:

Adilson Gomes da Silva: 42.450,00

Alexandre Vasconcelos Castro: 770.000,00

Anita Leocádia Pereira da Costa: 420.000,00

Anita Leocádia Pereira da Costa/Paulo Rocha: 50.000,00

Antônio de Pádua de Souza Lamas: 350.000,00

Antonio Fausto da Silva Barros: 44.552,20

Aureo Macato: 300.000,00

Cantídio Cotta de Figueiredo: 85.676,84

Century Participações Ltda: 100.000,00

Charles dos Santos Dias: 100.000,00

Cristiano de Mello Paz: 1.294.372,44

Cristiano de Mello Paz e Marcos Valério: 1.434.126,73

Cristiano de Mello Paz e Ramon Hollerbach Cardoso: 4.528.183,45

Cristiano Paz e Simone Vasconcelos: 171.260,40

Cristiano Paiva Neves: 300.000,00

David Rodrigues Alves: 6.800.000,00

Einhart Jacome da Paz/Lia Ferreira Gomes: 50.000,00 (cunhado/irmã de Ciro Gomes)

Eliane Alves Lopes: 300.000,00

Francisco de Assis Novaes Santos: 2.450.000,00

Francisco de Assis Novaes Santos/Martinez: 250.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Adhemar de Barros: 166.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/BRA LTDA: 150.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Destilaria Barra: 300.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Edna Artero: 350.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Engefin LTDA: 150.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Erste Banking: 650.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Francisco Santos: 200.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto: 2.494.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/LC Imóveis S.A.: 255.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Shaim Engenharia: 300.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Temon LTDA: 800.000,00

Guaranhuns/Waldemar Costa Neto/Unitow LTDA: 95.000,00

Guaranhus Participações Ltda: 327.500,00

José Nobre Guimarães 150.000,00: (irmão do deputado José Genoíno)

Isabel Cristina Estevão: 150.000,00

Ita Participações e Empreendimentos Ltda: 50.000,00

Jacinto de Souza Lamas: 600.000,00

Jader Cunha de Oliveira: 67.000,00

Jair dos Santos: 300.000,00

João Cláudio de Carvalho Genu: 1.000.000,00

João Ferreira dos Santos: 260.000,00

João Magno de Moura: 42.000,00 (Deputado do PT/Ipatinga)

José Antônio Campos Chaves: 56.000,00

José Luiz Alves: 200.000,00

Josias Gomes da Silva: 100.000,00 (Deputado do PT/Bahia)

Leopoldo Hubner Passos/Maria Beatriz Passos: 100.000,00

Luis Carlos Costa Lara: 300.000,00 (Minas Gerais)

Luiz Carlos de Miranda Faria: 68.541,84 (Ipatinga)

Luiz Carlos Masano; 50.000,00

Luiz Eduardo Ferreira da Silva: 326.660,67

Marcia Regina Milanesi Cunha: 50.000,00 (Mulher do deputado João Cunha, PT/SP)

MÁRCIO LACERDA: 300.000,00 (candidato a prefeito de Belo Horizonte apoiado por Aécio e Pimentel e outros comensais)

Marcos Valério Fernandes de Souza: 125.520,00

Marcos Valério /Renilda Maria Santiago F. de Souza: 162.411,00

Marcos Pinto Mendes Coelho Saraiva: 150.000,00

Marcos Valério /Ramon Hollerbach Cardoso: 469.014,00

Marcos Valério /Simone Reis Lobo de Vasconcelos: 13.000,00

Maria Tereza Chaves de Mello Paz: 20.000,00

Mario Sérgio Augusto dos Santos: 50.400,00

Martinez: 400.000,00

Multcash Ltda: 800.000,00

Nestor Francisco de Oliveira: 102.812,76

Newton Vieira Filho: 342.704,60

Otília de Camargo da Costa: 140.000,00

Paulão - Pt - Nordeste: 160.000,00

Paulo Leite Nunes: 102.812,76 (Romeu Queiroz/PTB)

Paulo Eduardo Luiz Mattos: 100.000,00

Paulo Roberto Menicucci: 205.000,00 (PSDB/MG)

Paz Publicidade Mkt Ltda: 150.000,00

PT Nacional: 350.000,00

Raimundo Ferreira Silva Junior: 100.000,00

Ramon Hollerbach Cardoso: 1.828.527,14

Ramon Hollerbach Cardoso e Simone Vasconcelos: 400.000,00

Renato Bemfica Vilela/Magdalena Bemfica Vilela: 150.000,00

Renilda Souza: 100.000,00 (Mulher de Marcos Valério)

Roberto Costa Pinho: 200.000,00

RODRIGO BARROSO FERNANDES: 274.167,36 (Assessor de Pimentel, praticamente um irmão)

Rogério Lanza Tolentino: 50.000,00

Romeu Queiroz: 50.000,00 (Deputado, PTB/MG)

Rosielma Barreto Lemos Andreza: 200.000,00

Ruy Millani: 250.000,00"
OBSERVAÇÃO: (alguns nomes foram retirados do original em vista dos pequenos valores)

terça-feira, 2 de setembro de 2008

A CAMPANHA DE BELO HORIZONTE EM AGOSTO DE 2008

1) Qual o significado de uma campanha onde se busca o voto popular? Pede-se ao povo uma autorização para tomar decisões que serão acatadas por todos posteriormente, respeitadas as regras do jogo democrático previstas constitucionalmente. Não é uma delegação como muitos ainda pensam. Esta última é da esfera do direito privado e, não, do direito público. Mandato de um político, em qualquer esfera, não se compara a uma procuração dada a um advogado, por exemplo, para defender interesses específicos. Neste sentido, a credibilidade é algo fundamental. Ao autorizarmos alguém a governar estamos cientes que o interesse público irá presidir todas as ações posteriores durante o decorrer do mandato e que o eleito decidirá sobre questões que afetam a toda a sociedade.

2) A campanha, até aqui, mais bem sucedida é a do candidato Márcio Lacerda. O que nutre sua meteórica subida nas pesquisas de intenção de voto é o apoio dos atuais governador e prefeito, explicitado numa contundência jamais vista em outras campanhas. Uma publicidade maciça e bem feita faz com que ele se aproxime da possibilidade de vencer a eleição ainda no primeiro turno. Sem entrar no mérito da receptividade de Aécio e Pimentel junto ao eleitorado, pode-se concluir que a percepção dos belorizontinos sobre o que está disponível como alternativa (os demais candidatos), transfere para Lacerda a avaliação positiva dos seus dois patrocinadores. Pouco importa o que ele fale (aliás, não fala nada), ou o teor de suas propostas (que são claras, pois diz, tão somente, que vai continuar o que está sendo feito há anos). É uma figura maleável que concorda com tudo e que proclama, com sorriso e postura angelical, sua devoção e fidelidade a Lula, a Aécio, a Pimentel, a Ciro Gomes, a Célio de Castro, a Patrus Ananias e a quem mais ele precisar se referir. Até a angulação corporal é estudada para transmitir humildade (olhando de baixo para cima como se a pedir desculpas e mercês, com o queixo embarbichado colado ao peito). Sua imagem é reforçada pela generosidade pois teria distribuído parte do dinheiro da venda de uma de suas empresas para os empregados). Todo esforço publicitário é para dizer que Lacerda é um homem bom, humilde e trabalhador, com experiência em servir – verbo fundamental – ao presidente, ao governador e, agora, ao povo da capital, se este assim o permitir, no próximo dia cinco de outubro. Em suma, os “pais” de Lacerda infantilizam a população achando que somos todos um bando de patetas e, talvez, até tenham razão.

3) A campanha de alguns, como o Serjão Miranda, perde-se em clippings publicitários (com falas de populares e outros), desperdiçando precioso tempo de televisão e de rádio. Estas criações só servem para encher lingüiça de quem tem muito tempo disponível.

4) O caminho para a oposição, em vista destas pequenas reflexões, é simples: há que demolir Márcio Lacerda. Ele não tem luz própria para liderar a cidade nem tem as qualidades pessoais fundamentais de um homem público, dentre as quais brilha a honestidade em toda sua ampla concepção (valor caro a uma boa parcela da população, apesar do descrédito generalizado de todos os políticos). Quais deveriam ser os pontos a serem atacados?

1º.) Seu envolvimento com o maior escândalo já ocorrido no Brasil – o caso do “mensalão”, conforme denunciado por Marcos Valério publicamente. Este fato, por sinal, foi o que motivou sua saída do ministério da Integração Nacional, onde era Secretário-Executivo, ou vice-ministro de Ciro Gomes. Um homem enredado com dinheiros de má origem (como aqueles do mensalão), pode ser o gestor dos cinco bilhões do orçamento da PBH? Alguém votaria em Marcos Valério, apenas para ficar num dos outros nomes mais notórios, para ser tesoureiro de um condomínio ou para ser diretor financeiro de uma empresa onde o eleitor fosse acionista? E Márcio Lacerda, receberia, também, sua confiança ou um cheque em branco?

2º.) Sua participação na concepção e execução do projeto de transposição do rio São Francisco. Este malsinado projeto recebeu a condenação irrestrita de todos os mineiros (e, até, do governador Aécio), sendo considerado uma afronta aos direitos de todo o povo de Minas Gerais. Como pode uma pessoa que trabalhava contra os mineiros querer, agora, ser prefeito da capital do estado?

3º.) Seus obscuros vínculos com a ditadura militar que permitiram a ele se enriquecer prodigiosamente. Se ele tivesse sido, realmente, um perseguido político, não teria se transformado num dos grandes fornecedores do sistema de telefonia governamental. Fazer, agora, pose de injustiçado pelos milicos só engana a quem quer ser enganado. Negócios com empresas públicas só são feitos quando se tem bons “padrinhos” e sólidas relações políticas. Atualmente, conforme se pode deduzir de sua declaração patrimonial entregue à justiça eleitoral ele vive de aplicações financeiras em poderoso banco estrangeiro – o UBS/Pactual. Para quem não conhece os meandros das altas finanças, isto significa que sua renda provém em grande parte da dívida pública, vale dizer, dos monumentais juros que o governo federal é obrigado a pagar para financistas e agiotas.

4º.) Sua alardeada generosidade (com distribuição entre os empregados de U$1,5 milhão de dólares, segundo diz sua propaganda), é contraditória com os débitos fiscais de uma de suas empresas com o poder público. Somente com a prefeitura de Belo Horizonte há um contencioso de milhares de reais, conforme atesta ação de execução fiscal no Foro da Capital. Quer dizer, a doação de dinheiro aos ex-empregados se fez, mesmo, às expensas da população, ou dos cofres públicos, numa verdadeira mesura com chapéu alheio. E se ele, por acaso, se eleger prefeito? Vai pagar o que deve, que foi sonegado, ou vai cancelar a dívida ajuizada pela prefeitura? Esta dúvida moral é perfeitamente legítima de ser levantada. Estas são questões concretas que têm passado ao largo da campanha de Belo Horizonte e que precisam ser corretamente respondidas pelo pretendente.

4) Uma trombada desta magnitude poderia provocar uma tsunami política e eleitoral. Algo como jogar bosta no ventilador, sem garantia de que os benefícios seriam apropriados, necessariamente, pelo denunciante. Desmascarar o candidato oficial, entretanto, deve ser parte de uma proposta de governo assentada sobre valores fundamentais para a boa política, em conformidade com as maiores autoridades do judiciário. Pois não está o TSE fazendo firme pregação sobre a importância do voto consciente? Não está sendo propagado na TV um conjunto de filmetes defendendo uma postura crítica do cidadão? Não propala o próprio governo estadual sobre a relevância de se denunciar crimes e criminosos? Pois bem: os atos de Márcio Lacerda representam um tipo de delinqüência política que cabe repudiar. Nada pessoal, pode dizer-se. O importante é que o esclarecimento sobre as mistificações e as fraudes precisa ser tornado público antes da decisão eleitoral. Isto feito, no horário gratuito da TV (pois a imprensa jamais daria guarida a questionamentos deste tipo), dar-se-ia um nó no governador e no prefeito, que seriam obrigados a sair em defesa de Márcio Lacerda ou, então, a se calar pressionados pelo clamor ético. Pois como explicar o apoio a um homem com qualidades e histórico tão duvidosos? A população vem aceitando a imposição tácita de seu nome por não ver nele nada de reprovável. Este desvelar, ou para usar velho adágio popular, este destampar do pinico, pode obrigar o eleitor a se reposicionar no processo. Não dá para fazer isto que está sendo proposto de uma forma bem comportada. É um tiro de canhão com efeitos desmoralizantes. Gente sem credibilidade não pode ter esta ousadia. E, afinal, de contas, onde já se viu política bem comportada? O PT, para ficar num exemplo óbvio, sempre praticou o estilo “chute na canela”. E querem, agora, ser afagados? A ousadia – e isto é um truísmo vulgar - é inseparável da vitória. Chamar Márcio Lacerda a dar explicações, principalmente em entrevistas aos meios de comunicação, vai deixá-lo em má situação, em vista de suas notórias dificuldades de enfrentamento. Sua medíocre participação no debate da TV Bandeirantes é uma amostra de sua incapacidade e falta de jogo de cintura.

5) Mas poderás tu, meu irmão e meu companheiro, vaso do mesmo barro, agir como aconselhava Teodoro (n’ O Mandarim, de Eça)? Que dizia: só bem sabe o pão que ganha o suor de teu rosto; nunca mates o mandarim! Serás tu capaz de “matar” politicamente o Lacerda? Até agora a propaganda do homem tem dado um passeio nos concorrentes. E veja que ela está sendo potencializada, indiretamente, pela propaganda do governo de Minas, que não deixou de ser feita mesmo durante o período eleitoral. Convenhamos que é impossível fazer uma contra-propaganda, até por falta de meios materiais. Mas um desmonte da imagem do Márcio Lacerda, apelando para fatos que não possam sofrer contestações judiciais, vai neutralizar o efeito do apoio do governador e do prefeito. Se a população é conservadora – e os fatos e os números parecem confirmar isto – por que não apelar para a faceta moral, que é parte indissociável do conservadorismo? Em suma, você votaria num candidato a prefeito envolvido no escândalo do mensalão? O atual prefeito tem entre seus “assessores especiais” outro dos nomes que apareceram como recebedores das malas de dinheiro de Marcos Valério, o carequinha safado – um tal de Rodrigo Barroso, ex-secretário municipal da Cultura e ex-presidente da Fundação Municipal da Cultura de Belo Horizonte e, também, apoiador da campanha de Pimentel em 2004. Quando o escândalo explodiu trataram de tirá-lo da linha de fogo e colocá-lo nesta “assessoria especial”. Outra vez pergunto: você votaria num candidato a prefeito que, contrariando todos os mineiros, coordenava o projeto de transposição do rio São Francisco? Mais uma pergunta para finalizar: você votaria num candidato a prefeito que estivesse sendo executado por sonegação fiscal pela própria prefeitura que ele quer assumir? Um candidato com este perfil conseguirá estabelecer compromissos aceitáveis com nossa cidade? Alguém pode confiar que Belo Horizonte estará em boas mãos se Lacerda for prefeito? Colocar R$5 bilhões nas mãos de uma pessoa com este passado não é um risco que não se deve correr?

6) Ponto importante que não deve ser negligenciado é que as pesquisas estão captando muito mais intenção de voto que decisão de voto. Isto é o que explica a subida meteórica do Márcio Lacerda com apenas duas semanas de campanha pela mídia. Ele precisa receber um tiro na asa. Ainda há tempo para isto. A própria “indefinição” da maioria do eleitorado durante tanto tempo mostra esta possibilidade.

Sôbre a ética e o jeitinho no Brasil (extraído do site do Prof. Roberto Romano)

O candidato a vereador Ricardo Holz (PMDB), da coligação São Paulo no Rumo Certo, tem usado uma organização não-governamental para conseguir votos em troca da promessa de obter bolsas de estudo em universidades particulares. A lei caracteriza como compra de voto o oferecimento ou a promessa ao eleitor de vantagem pessoal de qualquer natureza, em busca de seu apoio. Pesquisa recente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) mostrou que 61% dos entrevistados conhecem alguém que trocaria favores por voto, mas 89% condenam quem faz isso.
Holz é presidente do Instituto Bolsa Universidade, uma ONG que funciona em uma pequena sala do 3º andar de um conjunto comercial da Rua 24 de Maio, centro da cidade. A entidade, segundo seu site, consegue “bolsas parciais de 5% a 70%” em “faculdades ou universidades parceiras do instituto” para quem “siga os passos e normas estipulados pelo instituto”. Em seu site na internet, o instituto informa que tem parceria com 63 faculdades. A reportagem falou com quatro das mais conhecidas delas, PUC-São Paulo, Mackenzie, Uniban e Unip. As três primeira negaram ter a ONG como parceira. A Unip disse que tem convênio com a entidade, mas não comenta o uso das bolsas.
O interessado na obtenção da bolsa, ao procurar a sede da instituição, é levado por uma funcionária até outra sala do mesmo andar. Não há placas da ONG nessa nova sala, apenas adesivos da candidatura de Holz. Depois de perguntar qual o curso de interesse e até quanto o interessado pode gastar por mês com a faculdade, os atendentes avisam que o presidente da entidade é candidato a vereador e que para ter uma “atenção especial” e o nome incluído na lista de possíveis beneficiados é preciso conseguir para ele os votos de 20 pessoas. A reportagem do "Estado de São Paulo", após se cadastrar, foi até o local. O repórter recebeu duas folhas de papel com o nome de Holz, número eleitoral no cabeçalho e uma lista para ser preenchida com os dados de 20 eleitores que dariam seu voto. Ela inclui a zona eleitoral onde ele vota, para futura conferência.

Ontem, em novo contato por telefone, uma funcionária disse que há 12 anos a ONG concede as bolsas, mas este ano teria prioridade quem apoiasse a candidatura de Holz. “Se você trouxer 30 pessoas que se comprometam a votar no Ricardo, a bolsa é de graça. Mas fica entre a gente”, disse ela. Com as folhas, o funcionário entregou um envelope com material de campanha, inclusive folhetos mostrando Holz ao lado do candidato Gilberto Kassab (DEM). Holz nega que esteja comprando voto. “Eu peço o apoio dos associados. Não autorizo que façam isso.”
"Um hábito antigo, de Estados onde o cidadão não tem direitos nem deveres"
de Gabriel Manzano Filho.

O gesto do candidato Ricardo Holz é uma prova - mais uma - de que modernidade não é garantia de democratização e antigos hábitos sobrevivem nas novas formas de mando das sociedades atuais. Quem o diz é o professor de Ética da Unicamp Roberto Romano, veterano estudioso dos bons e maus costumes da vida brasileira. “É uma coisa lamentável, mas não surpreendente”, diz ele. “A compra de votos já era uma coisa comum no Império Romano.” “Platão se irritava com essa tradição na Grécia antiga e Maquiavel a condenava na Florença no século 15. O autor italiano Luciano Canfora identifica o costume há 2 mil anos, no seu livro Júlio César, o Ditador Democrático”.

Mas por que o hábito é tão marcante no Brasil? “Porque nossa história é uma permanente negação, na vida social, da democracia e do liberalismo. A ausência de liberdade moldou a vida dos municípios. Construiu-se, desse modo, um sistema em que o indivíduo não tem direitos, mas, também, não tem deveres. Ele não é cobrado, não sente o dever de observar limites ou princípios.” Na origem disso está o monopólio do poder pelo Estado, diz ele. “Vivemos num ambiente em que tudo se concentra no Executivo, que ainda fica com 70% do total dos impostos. Isso estrangula as aspirações do sujeito e ele recorre a truques para se safar. O deputado e o vereador se tornam estafetas de luxo, que fazem a mediação entre quem tem o poder e o dinheiro e quem dele precisa.”

Roberto Romano observa que o povo brasileiro conviveu, desde as origens do País, com experiências de absolutismo monárquico. Seguidas rebeliões liberais foram massacradas. A República Velha herdou esse viés absolutista do Estado. “Tudo conduziu à desvalorização do indivíduo - o catolicismo dominante, conservador, o monopólio de poder exercido durante a República Velha, as duas ditaduras no século 20. Dessa salada saíram os valores sociais que moldam nossas relações sociais de hoje.” O que temos como eleitorado é uma clientela, diz ele. “E onde há clientela há o jeitinho.”

A ditadura militar: quem se beneficiou?

Hoje já se tornou uma sólida tradição falar mal da ditadura militar, que vigiu no país entre 1964 e 1985, como estratégia para obtenção de votos em qualquer eleição que se apresente, municipal, estadual ou federal. Os generais daquela época, a maioria já morta e enterrada, sofrem assim como o antigo Bey de Túnis sofria sob a pena de Eça de Queiroz. Na falta de assunto para preencher um artigo que lhe era cobrado, o grande romancista e cronista português sacava do bolso do colete um tema infalível: baixar o cacete no tal Bey (título nobiliárquico do dirigente muçulmano da cidade de Túnis, algo equivalente ao título de Scheik, de Xá ou de Califa). Como a referida figura era detestada por todo o mundo civilizado, fazer-lhe toda e qualquer crítica era garantia de boa recepção por parte dos leitores.

Márcio Lacerda, candidato a prefeito de Belo Horizonte - um verdadeiro Tio Patinhas, tal sua fabulosa fortuna - também se coloca politicamente como um daqueles que combateram a ditadura militar. Chega ao requinte de acrescentar que "conhece Pimentel (atual prefeito da capital) há mais de 40 anos, quando lutaram juntos contra a ditadura pela volta da democracia no Brasil". Insinuando cruel perseguição movida contra ele pelos milicos, não pôde arrumar um bom emprego para se sustentar, tendo que se conformar em ser um simples estagiário da antiga Cia. Telefônica de Minas Gerais. Mas ele percebeu que isto não era tão ruim como podia parecer a uma primeira vista. Seguindo famoso conselho dado por Delfim Neto naquele tenebroso período, que pontificava : ("se eu fui estagiário da Gessy-Lever e cheguei a ministro, qualquer um pode fazer o mesmo"). Márcio Lacerda, talvez por também ser economista e captar competentemente as lições do balofo ministro, viu que os milicos eram duros mas podiam ser amaciados. Lulinha da Silva, nos dias atuais, parece que resolveu seguir a mesma recomendação de Delfim Neto. De simples estagiário no zoológico de São Paulo, durante o mandato da Dona Marta Suplicy, o jovem empreendedor já virou promissor empresário durante o mandato do generoso pai (e, por coincidência, navegando nas mesmas águas onde já havia navegado o Lacerda, ou seja, no ramo da telefonia). É verdade que nos tempos em que Márcio Lacerda se estabeleceu - e construiu alianças com os milicos que mandavam nas empresas de telefonia brasileiras, que eram todas estatais - qualquer fornecedor (ou parceiro, como se diz hoje), tinha que passar pelo crivo político dos generais. Ou será que não tinham? Se não tinham, então esta história de perseguição foi uma lorota, simples propaganda enganosa. Lulinha da Silva, fez melhor. Aliou-se com empreiteiros que controlavam a Telemar (atual Oi), e que, por extraordinária coincidência, também são os maiores contribuintes das campanhas de Lula pai, e virou sócio da Telemar. Este parece ser mais esperto que Márcio Lacerda. A continuar neste ritmo vai ter uma fortuna, nos próximos anos, superior à do pobre estagiário de Belo Horizonte.
Em todo caso, justiça seja feita: a ditadura militar fez bem aos negócios de Márcio Lacerda. Se ele tivesse entrado num emprego público, ou em alguma burocracia privada, talvez não fosse, hoje, mais que um sujeito de classe média, tipo funcionário público aposentado reclamando do governo e querendo fazer alguma greve ou manifestação contra os neoliberais de plantão. Sua sorte, ou esperteza, ou convenientes relações comerciais foi se estabelecer e, graças à sua "capacidade de liderar equipes e sua visão moderna e inovadora" levar "uma pequena empresa a se tornar uma das maiores de Minas e do Brasil", conforme rezam seus coloridos comerciais espalhados por toda Belo Horizonte. Mais rico que Maluf - que sempre teve fama de ser serviçal dos militares e capacho da ditadura - Márcio Lacerda é um exemplo de que se pode defender o socialismo e a revolução e, ao mesmo tempo, se tornar um nababo. Aliás, pelos exemplos de outros considerados "subversivos" daqueles tempos (como o lobista José Dirceu e a turma do mensalão), só os tolos não perceberam que combater verbalmente os generais (e por baixo do pano fazer bons negócios com eles), era a grande sacada, o verdadeiro mapa da mina. Estão aí as gordas aposentadorias especiais, as polpudas indenizações e outras sinecuras propiciadas pelo regime lulista da silva.

A meu pai

Nascido em 12 de abril de 1923, e falecido em 26 de agosto de 2008, era meu pai - Ephigênio de Oliveira Carvalho - a resultante de uma mistura de panteismo com ceticismo. Ensinou-me a ler Augusto dos Anjos e o grande poeta persa Omar Khayyán, cuja Rubaiata 161 segue abaixo. Creio que ele gostaria que tais versos lhe fossem dados por epitáfio.


Rubaiata 161

"Não só aqueles
que a velhice colheu,
como aqueles
que só conheceram
a juventude,
um a um foram partindo
mal haviam chegado.

Ninguém cria raízes
neste mundo enganador...

Uns partiram,
partirão os demais.

E os outros que estão para chegar
partirão também".

Seu talento como sonetista brindou-nos com uma das mais vívidas descrições do processo político brasileiro. No soneto denominado "3 de outubro" (data em homenagem ao dia no qual se realizavam as eleições após 1930), dizia ele, em 1960:

Ei-los vendilhões da Pátria escravizada,
Ei-los a disputar a marmita e a gamela.
Imorais fariseus arautos da embrulhada,
A preparar ao povo a cangalha e a sela.

E este povo infeliz que tomba na esparrela,
Que não compreende a fraude nem entende nada,
Não vê que esta canalha a própria pança zela,
E quer ver a caveira à plebe degradada.

No fim da apuração o eterno resultado
(Que desde oitenta e nove a nação avassala),
Levando ao poder o patife e o tarado.

C'o ajuda do eito vil e c' os votos da senzala,
Caco se elege e Ali-Babá é deputado,
Numa competição de rifa e de cabala.