Uma das características mais
persistente do petismo é sua oposição radical a “tudo isso que está aí”.
Essa é a expressão síntese da chamada cultura do repúdio, a qual marca
indelevelmente os adeptos e simpatizantes do PT. Pode-se ainda incluir nesse
bloco os miúdos agrupamentos que gravitam em torno daquele partido, como a REDE
(de Marina Silva), o PC do B, o PSOL, o PSTU e outras frações mais minoritárias
ainda, tipo PCO e PCB.
Com sua desfaçatez habitual,
o petismo percebeu que em cidades como Belo Horizonte, marcada por um forte
sentimento oposicionista, uma candidatura a prefeito pelo PT estaria condenada
a naufragar. As manifestações dos últimos anos, quando a classe média rebelada
foi para as ruas questionar especialmente Lula, Dilma e o PT dão a conhecer a dimensão profunda de tal
sentimento de rejeição. É bom recordar que apesar de Dilma ter vencido as eleições
de 2014 em Minas Gerais, ela não ganhou em Belo Horizonte.
Se os fatos vêm ratificando dia após dia o conceito geral sobre a
podridão e canalhice das hostes petistas, não é menos verdade que a quadrilha
chefiada por Lula é profissional e imaginosa nas artes da política. Veja-se que Patrus
Ananias, deputado federal, ex-ministro de Lula e Dilma além de ex-prefeito da
capital mineira, seria indubitavelmente o melhor nome do PT para a disputa em
outubro. Com seu jeitão sonso de sacristão aposentado, Patrus ainda mantém
imagem de pessoa honesta e respeitável em Belo Horizonte, apesar de vaias recebidas
recentemente em lugares públicos. Recusou, no entanto, ir para a disputa,
desconfiado e matreiro que é. Ele sabe que a batata do PT está quase assada.
Alguém, entretanto, tinha que ir para o sacrifício.
Arrumaram, então, um obscuro parlamentar do PT (um tal Reginaldo Lopes), para encabeçar
a chapa majoritária, secundado por uma esquisita deputada do PC do B (uma tal
Jô Morais), reavivando o velho pacto, da legenda principal com sua subserviente
e histórica sublegenda, num dueto medonho sob todos os aspectos. Isso foi o máximo que conseguiram agrupar para
apresentar aos moradores de Belo Horizonte. A fragilidade eleitoral da pavorosa dupla
pode ser aferida pelas pesquisas que são divulgadas periodicamente; não
ultrapassam os 3% da preferência entre os consultados. É uma proporção digna de
candidatos a vereador.
Ficou, pois, uma dúvida ou interrogação. Para quem, ou para onde, irão os votos dos petistas e dos comunistas do Brasil, que os há em Belo Horizonte, apesar de minoritários? Qual candidato
mais se assemelha àqueles que, antigamente, viviam a bradar que são “contra tudo isso que
está aí?”
A resposta é simples e surpreendente. Da mesma maneira que a luva deve se
ajustar à mão, o petismo desamparado, o marinismo da nova política e os verdes lançaram um
nome que capturasse aquele antigo eleitor do PT: os revoltados contra a
situação em geral, os que fazem restrições à política e aos políticos (da mesma
maneira que o fizeram Collor, o caçador de marajás, e Dilma, a supergerente,
aquela que fazia e acontecia).
Dilma e Collor nunca se davam ao desfrute de dar
confiança aos políticos tradicionais, que sempre desprezaram, preferindo ficar
nos seus conchavos corruptores com meia dúzia de apaniguados. Acharam Kalil disponível (empreiteiro de férias, imagine-se o non sense), fazendo dupla com um vice-prefeito provindo da Rede, de Marina Silva, a porta voz de uma pretensa "nova política" que, aliás, ainda não deu as caras em Belo Horizonte.
Kalil se apresenta bancando o “gerentão”, pondo e
dispondo, no seu peculiar estilo “deixa que eu chuto”, como se uma prefeitura
complexa igual a de Belo Horizonte fosse um clube de futebol dirigido a golpes e gritos. Seu bordão, repetido à exaustão, é "chega de político, agora é Kalil". O petismo envergonhado não teve dúvidas. Saindo dos subterrâneos da ação política vai encaminhando para Kalil suas intenções de voto, tudo sob as bênçãos discretas do governador Pimentel.
Kalil só não obterá êxito se for mostrado ao povo de Belo Horizonte seus vínculos com Collor e Dilma. Os três, por sinal, pensam de forma semelhante. Por isso seus gestos igualmente similares. Kalil é uma espécie de Dilma menos analfabetizado. Herdou de Collor o histrionismo, as caretas e o raciocínio raso. Resulta, enfim, nessa peculiar disputa mineira um híbrido de empreiteiro com ecochatos, configurando um novo avatar. Só pela magia tal absurdo poderá se viabilizar concretamente.