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Mosquito que vai ajudar a derrubar Pimentel |
"Em
12 de janeiro deste ano o governo de Minas Gerais decretou situação de
emergência em saúde pública por 180 dias nas áreas do estado onde há surto de
febre amarela. O decreto contempla 152 cidades no entorno de Coronel
Fabriciano, Governador Valadares, na região leste do estado, Manhumirim, na
Zona da Mata, e Teófilo Otoni, no Vale do Jequitinhonha e Mucuri. Em Minas,
trinta pessoas morreram com sintomas da doença neste ano.
A situação atual e preocupante das arboviroses no Brasil reflete um complexo
contexto, no qual interagem entre si ineficácias gerais de atuação do poder
público e da sociedade em geral.
Os
condicionantes da expansão das arboviroses nas Américas e no Brasil são
similares e referem-se em grande parte ao modelo de crescimento econômico
implementado na região, caracterizado pelo crescimento desordenado dos centros
urbanos.
O
Brasil concentra mais de 80% de sua população em áreas urbanas, com importantes
lacunas no setor de infraestrutura, tais como dificuldades para garantir o
abastecimento regular e contínuo de água, assim como também é deficiente a
coleta e destinação adequada dos resíduos sólidos. Outros fatores, tais como a
acelerada expansão da indústria de materiais não biodegradáveis, além de
condições climáticas favoráveis, agravadas pelo aquecimento global, conduzem a
um cenário que impede, pelo menos a curto prazo, a proposição de ações visando
à erradicação do vetor transmissor.
Dentro
desse contexto, é com enorme preocupação que deparamos com as notícias que
revelam o ressurgimento de casos de febre amarela em nosso país.
Como
apontado em Boletim da Organização Mundial da Saúde de maio de 2016, “grandes
epidemias de febre amarela ocorrem quando pessoas infectadas introduzem o vírus
em áreas densamente povoadas onde exista elevada densidade de mosquitos
transmissores e onde a maioria da população apresente pouca ou nenhuma
imunidade, tendo em vista a baixa cobertura vacinal. Sob tais condições,
mosquitos infectados transmitem o vírus de pessoa a pessoa”.
Essa
é situação prevalente no Brasil atualmente; conquanto os casos até agora
relatados o tenham sido em regiões com densidade populacional inferior àquela
de nossas grandes metrópoles, sabemos da facilidade de deslocamento das pessoas
nos dias de hoje. E, caso pessoas infectadas nessas áreas menos povoadas venham
à metrópole, vão encontrar ambiente totalmente favorável à disseminação do
vírus da febre amarela. Lembremos que as outras arboviroses atualmente
prevalentes em nosso meio (dengue, zika e chikungunya) também se originaram em
ambientes rurais e atingiram a dimensão que conhecemos tendo em vista as
condições supramencionadas que permitiram sua disseminação.
Nossa
proposta para nos defrontarmos com esse grave problema tem por base as
diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde também em maio de
2016: “A rápida detecção de casos de febre amarela e uma rápida resposta através
de campanhas de vacinação emergencial são essenciais para o controle de surtos.
Ressalte-se,
não obstante, que nessas situações a subnotificação é preocupante e estima-se
que o número real de casos seja dez a 250 vezes maior]] que o número reportado.
A OMS recomenda que todo e qualquer país que se encontre sob risco de surto de
febre amarela tenha ao menos um laboratório nacional de referência onde possam
ser executados os testes laboratoriais que permitam o diagnóstico da doença. As
equipes responsáveis pela investigação devem avaliar e responder ao surto tanto
com medidas emergenciais como também com planejamento de longo prazo para
incrementar a cobertura vacinal”.
A vacina constitui-se
o mais importante meio de combate à febre amarela; é produto seguro, eficaz e
relativamente barato, sendo uma única dose suficiente para induzir imunidade de
longo prazo. Para a prevenção de surtos em regiões afetadas, a cobertura
vacinal deve alcançar ao menos 80% da população sob risco.
As recomendações da OMS em países onde há relatos de casos de febre amarela são
enfáticas no que tange à indicação de imunização de toda a população com idade
acima de 9 meses não previamente imunizada (em regiões epidêmicas há
recomendação de vacinação acima dos 6 meses de idade, quando então o risco da
doença é superior àquele do evento adverso da vacina).
No Brasil, vem sendo
empregada a estratégia de “vacinação de contenção”, isto é, vacinação de toda a
população em regiões onde foram descritos casos suspeitos e/ou confirmados de febre
amarela. Como os dados relatados vêm evidenciando uma rápida progressão da
doença, talvez essa estratégia não esteja se mostrando suficiente.
Precisaríamos ter uma vigilância epidemiológica atenta, com diagnóstico precoce
dos casos; caso se mantenha esse panorama inicial verificado no Estado de Minas
Gerais, certamente a abrangência da cobertura vacinal deveria ser ampliada,
provavelmente atingindo todo o estado.
Importante
também é a cooperação com serviços que monitorem de perto a mortalidade de macacos
e outros animais silvestres em regiões silvestres periurbanas, que se
caracteriza como “sentinela” quanto à proximidade da febre amarela dos centros
urbanos.
Em
resumo, temos de encarar o problema como sendo de enorme relevância; não
podemos menosprezá-lo, sob risco de nos depararmos com mais um expressivo
problema de saúde pública em nosso já combalido país".