sábado, 6 de junho de 2015

BNDES: a fuzarca com o nosso dinheiro



























O governo divulgou finalmente alguns detalhes dos contratos de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social com o exterior. A ferramenta, que pode ser acessada no site do BNDES, mostra valores, taxas de juros, destinos e motivos dos empréstimos feitos pelo banco a países da América Latina e da África. Os recursos são provenientes quase que totalmente do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A obra mais cara é a Usina Siderúrgica Nacional, na Venezuela, ao custo de 865,42 milhões de dólares. Confira os contratos mais caros financiados pelo banco fora do Brasil.

Para esclarecer melhor as coisas, faltou dizer que o FAT é resultante da união dos recursos provindos do PIS e do PASEP, vale dizer, é dinheiro que pertence aos trabalhadores da iniciativa privada e aos servidores públicos respectivamente. O BNDES é tão somente o gestor do numerário. Aqueles que trabalham no Brasil são, portanto, os financiadores reais de grandes obras em países de regimes desacreditados da América Latina e da África. Enquanto isso, o país sofre com a ausência de metrô, linhas ferroviárias, estradas, geradoras de energia etc., em benefício de Cuba, Venezuela, Angola e outras republiquetas. Aliás, para que a farra prossiga sem maiores dificuldades, o governo já definiu elevação das alíquotas do PIS/PASEP, sangrando o povo brasileiro para alimentar tiranos corruptos e desavergonhados.


As cinco empreiteiras que concentram o crédito à exportação são Odebrecht (US$ 8,2 bilhões, incluindo sua subsidiária em Cuba, a Companhia de Obras e Infraestrutura), Andrade Gutierrez (US$ 2,6 bilhões), Queiroz Galvão (US$ 388 milhões), OAS (US$ 354,2 milhões) e Camargo Corrêa (US$ 258,8 milhões).

Uma das operações que teve detalhes revelados foi a contratação de serviços da Companhia de Obras e Infraestrutura para obras de ampliação do Porto Mariel, em Cuba. A operação foi feita em cinco etapas, com contratos entre 2009 e 2013, totalizando US$ 682 milhões. Em cada uma das etapas, foi fixada taxa de juros em dólar, que variou de 4,44% a 6,91% ao ano. Enquanto isso, vocês, trabalhadores e empreendedores brasileiros, amargam taxas de juros de fazer corar um frade de pedra. Nem Schylock, o agiota d’O Mercador de Veneza, teria tal ousadia.




sexta-feira, 5 de junho de 2015

A agonia de um segredo (Fernando Gabeira)














"Quando surgiu, achei grave e um pouco subestimado o veto de Dilma ao projeto de transparência nos negócios do BNDES. Ela entrou em conflito com o Congresso. Dias depois, o próprio Supremo autorizou o Tribunal de Contas a ter acesso aos empréstimos ao Friboi, empresa que financia generosamente as campanhas do PT.

Em qualquer país onde o governo entre em choque com o Congresso e o Supremo o tema é visto como uma crise institucional. Como se não bastasse, Dilma entrou numa terceira contradição, desta vez consigo mesma: partiu dela a lei que libera o acesso aos dados públicos.

O ministro Luiz Fux (STF) sintetizou seu voto numa entrevista: num banco que move dinheiro público, o segredo não é a arma do negócio.

O PT tem razão para temer a transparência. Súbitos jatos de luz, como a denúncia do mensalão e, agora, do petrolão, abalaram seus alicerces. No caso do BNDES, não se trata da possibilidade de escândalos. É uma oportunidade para conhecer melhor a história recente.

Empresas amigas como a Friboi e a Odebrecht, governos amigos como os de Cuba e Venezuela, foram contemplados. Em ambos, a transparência vai revelar o viés ideológico dessa orientação. Um porto em Cuba, um metrô em Caracas são apenas duas escolhas entre mil possibilidades de usar o dinheiro. Para discutir melhor é preciso conhecer os detalhes. Na campanha Dilma mentiu sobre eles, ocultando o papel de fiador do Brasil.

O que sabemos da Friboi? Os dados indicam que destinou R$ 250 milhões a campanhas do PT. Teremos direito de perguntar sobre os detalhes do empréstimo do BNDES e até desconfiar de seus elos com campanhas eleitorais.

A análise da política do governo deverá estender-se à sua fracassada tentativa de criar empresas campeãs. Quem foram e quem são os parceiros, que tipo de transação? Como dizia Cazuza, mostre sua cara, qual é o seu negócio, o nome do seu sócio.

No momento do veto prevaleceu uma certa Dilma. Mas a outra Dilma, a que mandou a lei de acesso, é que estava no rumo certo da História. Não só porque a transparência é um desejo da sociedade, mas porque a tecnologia estreita o espaço do segredo.

Os debates nos EUA concentram-se hoje numa restrição à vigilância de indivíduos, sem licença judicial. Mas chegam a essa discussão graças a Edward Snowden, que revelou os próprios segredos do governo.

Ironicamente, Dilma foi espionada pelos EUA e decreta o sigilo nos dados de um banco que movimenta recursos públicos. Sou solidário com ela no primeiro episódio. Evidente que seria atropelada no segundo. Esta semana começou a ensaiar a retirada, via Ministério do Comércio, que vai disponibilizar dados das transações internacionais e algumas nacionais.

O PT deveria meditar sobre o segredo. Ele foi detonado pela quebra do segredo entre quatro paredes, no mensalão. Agora, no caso da Petrobrás, entraram em cena novos mecanismos de investigação, melhor tratamento dos dados.

Nos primeiros meses de governo, já tinha uma visão do PT. Nem todos a compartilhavam, pois o partido venceu três eleições depois de 2002. Aos poucos, os momentos de transparência sobre os escândalos foram criando uma percepção nacional sobre o tipo de governo que se implantou no Brasil.

Não há dúvidas de que os segredos do BNDES serão revelados. Sociedade, Congresso e Supremo caminham numa mesma direção. E o próprio governo começa a abri-los.

É um elo para a compreensão do papel do PT. Embora ainda não tenha os dados completos, já posso afirmar que o BNDES financiou pobres e ricos. Mas ambos, os pobres de socialismo, como os ricos aqui, do Brasil, são escolhidos entre os amigos do governo. De um modo geral, o processo foi de financiar amigos ricos para que construam para os amigos pobres.

Tanto a Friboi como a Odebrecht fazem parte dessa constelação política econômica que dominou o fluxo dos investimentos do BNDES. Isso teve repercussão nas campanhas eleitorais. De um lado, o Bolsa Família assegurava a simpatia dos eleitores: de outro, a bolsa dos ricos contribuía para as campanhas do tipo vivemos num paraíso. Contribuía, porque hoje sabemos que outras fontes menos sutis, como o assalto à Petrobrás, injetavam fortunas no esquema.

Falou-se muito no petrolão como o maior escândalo da História, mobilizando pelo menos R$ 6 bilhões. Quando todos os segredos, inclusive os do fundo de pensão, forem revelados, não importa a cifra astronômica que surgir daí: o grupo brasileiro no poder é o mais voraz em atuação no planeta. Não posso imaginar salvação depois da conquista desse título.

O PT e aliados podem continuar negando, na esperança de que o tempo amenize tudo. É uma tática de avestruz. Será que não se dão conta de que apenas um décimo da população os aprova hoje? O que será do amanhã, quando quase todos saberão quase tudo sobre o que fizeram com o País?

Nesta paisagem de terra arrasada, a economia é apenas uma das variáveis. O processo político degradou-se, os valores foram embrulhados por uma linguagem cínica, a credibilidade desapareceu já há tempo. O Brasil pode até conviver com esse governo, que tem mandato de quatro anos. Mas não creio que mude de opinião sobre ele, alternando momentos de um desprezo silencioso com as manifestações de hostilidade.

Um governo nasce morto e a lei nos determina um velório de quatro anos. Muito longos, até os velórios costumam ser animados. E algo que anima este velório é a revelação dos últimos segredos, como o sigilo do BNDES e tantas outras linhas de suspeita que foram indicadas nas investigações da Petrobrás. E daqui por diante nem o futebol será uma distração completa. A cúpula da Fifa transitou de um hotel cinco-estrelas para uma cela de prisão. 

Imprevisíveis roteiros individuais rondam os donos do poder. E essa história ainda será escrita com todas as letras".

quinta-feira, 4 de junho de 2015

Feitiçaria no MEC: Renato Janine Ribeiro revoluciona a educação brasileira

























O Ministro da Educação - Renato Janine Ribeiro - contratou um nome de peso para reforçar o ministério que cuida da Pátria Educadora.
O astrólogo Alexey Magnavita, que participou de um reality show na Record, e era orientado por Janine no doutorado da USP, agora é seu assessor direto.

Falta, agora, incluir um macumbeiro e um quiromante. O vestibular será feito consultando-se o mapa astral dos candidatos.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Humanizar quem?


O palácio do Planalto pretende humanizar a deplorável figura presidencial mandando-a passear de bicicleta pelos parques de Brasília.

Collor, também, já seguia o mesmo figurino nos tempos negros em que presidiu o país. Da experiência esportiva e peripatética de Dilma e Collor seria possível tirar alguma conclusão? Talvez sim. Só comparar.

A búlgara

O deplorável






















Um macaco, ao contrário das duas figuras acima, é uma boa referência. Até para andar de bicicleta o símio tem mais compostura.

O macaco

Superior Tribunal de Justiça? (Marco Antonio Villa)

O cadáver está sobre o morgue, graças ao professor Vila. A lição ainda é de anatomia, porém, anatomia patológica. Da trágica herança lusitana, a pior parte pertence à burocracia judiciária. Segue abaixo o artigo de Marco Antonio Villa.


Lição de anatomia (Rembrandt)



















"O Superior Tribunal de Justiça, que se autointitulou “tribunal da cidadania”, foi uma criação da Constituição de 1988. É formado por 33 ministros. O STJ recebe pouca atenção do grande público. O Supremo Tribunal Federal acaba ocupando todos os espaços. Uma designação de um ministro para o STJ passa geralmente em branco; já o mesmo não ocorre com o STF.

Em 2011 e 2013, examinei os gastos do STJ e fiquei estarrecido. Os artigos que publiquei, neste mesmo espaço, até hoje circulam pela internet (“Triste Judiciário” e “Eles estão de brincadeira”). Resolvi voltar ao tema, certo — e é a mais pura verdade, acreditem — de que algo teria mudado. Contudo, constatei que a situação não melhorou. Pelo contrário, piorou — e muito.

O curioso é que todos os dados aqui apresentados estão disponíveis no site do STJ, mais especificamente no Portal da Transparência. O último relatório de gestão anual disponibilizado é de 2013. Os dados são estarrecedores. O orçamento foi de R$1.040.063.433,00! Somente para o pagamento de aposentadorias e pensionistas foram despendidos R$236.793.466,87, cerca de um quarto do orçamento. Para os vencimentos de pessoal, foi gasta a incrível quantia de R$442.321.408,00. Ou seja, para o pagamento de pessoal e das pensões e aposentadorias, o STJ reservou dois terços do seu orçamento.

Setembro é considerado o mês das flores. Mas no STJ é o mês do Papai Noel. O bom velhinho, três meses antes do Natal, em 2014, chegou com seu trenó recheado de reais. Somente a dois ministros aposentados pagou quase 1 milhão de reais. Arnaldo Esteves Lima ganhou R$474.850,56 e Aldir Passarinho, R$428.148,16 — os dois somados receberam o correspondente ao valor da aposentadoria de 1.247 brasileiros. A ministra Assusete Dumont Reis Magalhães embolsou de rendimentos R$446.833,87, o ministro Francisco Cândido de Melo Falcão de Neto foi aquinhoado com R$422.899,18, mas sortudo mesmo foi o ministro Benedito Gonçalves, que abocanhou a módica quantia de R$594.379,97. Também em setembro, o ministro Luiz Alberto Gurgel de Faria recebeu R$446.590,41. Em novembro do mesmo ano, a ministra Nancy Andrighi foi contemplada no seu contracheque com R$674.927,55, à época correspondentes a 932 salários-mínimos, o que — incluindo o décimo terceiro salário — um trabalhador levaria para receber 71 anos de labuta contínua.

Nos dados disponibilizados na rede, é impossível encontrar um mês, somente um mês, em que ministros ou servidores — não exemplifiquei casos de funcionários, e são vários, para não cansar (ou indignar?) ainda mais os leitores — não receberam acima do teto constitucional. São inexplicáveis estes recebimentos. Claro que a artimanha, recheada de legalismo oportunista (não é salário, é “rendimento”), é de que tudo é legal. Deve ser, presumo. Mas é inegável que é imoral.

Em maio de 2015, o quantitativo de cargos efetivos era de 2.930 (eram 2.737 em 2014). Destes, 1.817 exerciam cargos em comissão ou funções de confiança (eram 1.406 em 2014). Dos trabalhadores terceirizados, o STJ tem no campo da segurança um verdadeiro exército privado: 249 vigilantes. De motoristas são 120. Chama a atenção a dedicação à boa alimentação dos ministros e servidores. São quatro cozinheiras, 29 garçons, cinco garçonetes e 54 copeiros. Isto pode agravar a obesidade, especialmente porque as escadas devem ser muito pouco usadas, tendo em vista que o STJ tem 32 ascensoristas. Na longa lista — são 1.573 nomes em 99 páginas — temos pedagogas, médicos, encanadores, bombeiros, repórteres fotográficos, recepcionistas, borracheiros, engenheiros, auxiliares de educação infantil, marceneiros, jardineiros, lustradores e até jauzeiros (que eu não sei o que é).

Para assistência médica, incluindo familiares, foram gastos, em apenas um ano, 63 milhões de reais e quatro milhões para assistência pré-escolar. Pela quantia dispendida em auxílio-alimentação — quase 25 milhões — creio ser necessário um programa de emagrecimento de ministros e servidores. Mas os absurdos não param por aí. Somente para comunicação e divulgação institucional foram reservados mais de sete milhões de reais. E não será por falta de veículos que o STJ vai deixar de exercer sua atribuição constitucional. Segundo dados de 31 de janeiro de 2015, a frota é formada por 57 GM/Omega, 13 Renault/Fluence e 7 GM/Vectra, além de 68 veículos de serviço, perfazendo um total de 146. E como são 33 ministros, cada excelência tem, em média, à sua disposição, quatro veículos.

Como foi exposto, há 2.840 efetivos e mais 1.573 servidores que são terceirizados, perfazendo um total de 4.413, que já é um número absurdo para um simples tribunal, apenas um. Ah, leitor, não se irrite. Ainda tem mais gente. Segundo o relatório anual de 2013 (volto a lembrar que é o último disponibilizado) há mais 523 estagiários. Sendo assim, o número total alcança 4.936 funcionários!

É raro uma Corte superior no mundo com os gastos e número de funcionários do STJ. Contudo este não é o retrato da Justiça brasileira. Onde a demanda é maior — como na primeira instância — faltam funcionários, o juiz não tem a mínima estrutura para trabalhar e está sobrecarregado com centenas de processos, além de — e são tantos casos — sofrer ameaças de morte por colocar a Justiça acima dos interesses dos poderosos. No conjunto não faltam recursos financeiros ao Judiciário. A tarefa é enfrentar, combater privilégios e estabelecer uma eficaz alocação orçamentária. Este dever não pode ser reservado somente aos membros do Poder Judiciário. Ele interessa a toda a sociedade".

(publicado em O Globo, em 02/06/2015)

terça-feira, 2 de junho de 2015

Como eram os egípcios na cama? (El País)





Temos uma ideia geral da sexualidade do antigo Egito que se baseia em boa parte nas passagens libidinosas de O Egípcio de Mika Waltari —Nefernefer nua nadando numa piscina—, no profundo decote da voluptuosa Cleópatra de Elizabeht Taylor e nos romances de Terenci Moix, nos quais não é raro que um escravo queira soprar na flauta do faraó. Mesmo os filmes de múmia têm um componente erótico - lembre-se do papel de Patricia Velásquez como Anck-Su-Namum e suas roupas reduzidas em O Retorno da Múmia. Apoiada em ingredientes como esses, prevaleceu a ideia popular de que a civilização da época dos faraós tinha, em estranha combinação com a obsessão pela morte e o além, e um sentido bastante espiritual da existência, um alto componente de lascívia e falta de pudor, como testemunhariam, por outro lado, as imagens arqueológicas de bailarinas semi-nuas, princesas com roupas transparentes e deuses com falo ereto.
Mas como eram, na verdade, os antigos egípcios nesse aspecto tão íntimo de sua cultura? Como eram, para falarmos de forma aberta, na cama? Um povo tórrido como seu clima? É difícil se enfiar nas alcovas de um povo desaparecido e o tema foi pouco tratado, algo que não é estranho por causa do puritanismo de uma disciplina que esteve nas mãos dos egiptólogos anglo-saxões. Existem uma monografia, canônica, Sexual life in ancient Egypt, de Lise Manniche (1987), e na Espanha um livro descontraído, com muita informação, do doutor em História Antiga pela Universidade Complutense José Miguel Parra Ortiz, Vida amorosa en el antiguo Egipto (Aldebarán, 2001). Em todo caso, o desenho que aparece através dos escassos indícios oferece uma realidade muito diferente do clichê popular.
Frente à falta de investigações neste terreno, acaba sendo muito interessante a que está realizando  o estudioso catalão Marc Orriols sobre a iconografia erótica do antigo Egito, que ele apresentou no III Congresso Ibérico de Egiptologia, em La Laguna (Tenerife) e no qual, sob os auspícios da Universidade de La Laguna, seu Centro de Estudos Africanos e o Instituto de Astrofísica das Canárias, participaram os maiores egiptólogos espanhóis. Orriols, que trabalha basicamente com a época do Império Novo, centrou-se na análise da cópula a tergo (por trás) que aparece especialmente representada nas famosas óstracas (fragmentos de pedra de calcário com desenhos informais) e grafites da cidade dos construtores de tumbas de Deir el Medina. A tergo? “Bem, por trás, mas por via vaginal”, explica o investigador com o tom mais neutro que é capaz. “Dispomos de poucas representações da cópula humana na iconografia egípcia e a que aparece com mais frequência é essa posição com o homem penetrando a mulher desta forma. Isso levou a supor que se tratava de uma prática habitual, talvez a forma característica de fazer isso no antigo Egito.”


O antes citado Parra é, precisamente, um dos que sustentam, em seu livro, que os egípcios tinham essa inclinação (que escolha de palavra). “No entanto, quando comecei a estudar o tema”, diz Orriols, “fiquei surpreendido de que na célebre análise da conduta sexual de 190 culturas humanas de Beach e Ford (Patterns of sexual behavior, 1955), não aparecia nenhuma na qual fosse preponderante a cópula por trás. Por que ia ser uma posição canônica então no Egito faraônico? Acho que é preciso procurar outras explicações, outra forma de ligar cultura e prática. Minha ideia é que essas representações não representam, na verdade, cópulas por trás, mas em sua maioria, sexo anal.”
Orriols considera que se trataria não de cenas sensuais, mas de algum tipo de humilhação, de demonstração de poder sobre opartenaire (a sodomização era isso no Egito faraônico; passividade = debilidade) e que os protagonistas seriam ambos masculinos em uma proporção maior do que parece.
Então, se os egípcios não faziam isso na maior parte das vezes a tergo, como faziam? Tinham alguma preferência? “A verdade é que não sabemos”, reconhece Orriols. “O que é significativo é o pouco que aparece o ato sexual em geral no mundo egípcio, antes da época greco-romana. Temos uma relativamente abundante iconografia referindo-se ao ato sexual entre divindades, mas pouquíssimas no âmbito humano, pouco mais do que trinta cópulas no total”. Certamente, os egípcios contavam em seu panteão com o deus Min, em perpétua ereção; Hathor podia ser bastante desinibida, e Geb e Nut e Osíris e Ísis (cada casal por seu lado) aparecem de maneira recorrente em imagens por todo o Egito. Mas tratava-se de uniões sagradas.
Por outro lado, no âmbito privado, cotidiano, explica Orriols, “temos pouca coisa, as óstracas, algum grafite como o de Wadi Hammamat. E temos o excepcional papiro erótico de Turim, de época ramésida, no qual aparecem desenhadas uma série de encontros sexuais muito explícitos entre homens adultos com grandes pênis e mulheres jovens no que foi interpretado com frequência como cenas de um bordel”. No papiro há nove cenas de cópulas, 3% a tergo. “Os desenhos de homens e seus desmesurados membros e as posturas acrobáticas das mulheres sugerem que estamos na frente de uma peça satírica, mas a verdade é que não conhecemos o propósito do papiro, que é um exemplar único.”

Parra, que também participou do congresso - com uma apresentação sobre um assunto tão atual quanto a violência doméstica (mas no contexto do antigo Egito) -, opina que o papiro de Turim poderia guardar a lembrança das vivências de um personagem em um prostíbulo, montado por ele para seu ócio pessoal.
Além da cópula a tergo, está representada no Egito a posição do missionário, mas “só em duas cenas, uma delas duvidosa”, diz Orriols. A outra, com uma garota na cama e um homem penetrando-a por cima, “parece ser um determinativo”, um sinal da escrita hieroglífica e não uma imagem erótica propriamente dita. Também existe alguma representação do que parece ser sexo em pé. Nos textos aparece algo de fetichismo, algumas alusões a pedofilia, prostituição masculina e zoofilia. Pouco mais. Nada que se possa comparar com a proliferação de cenas sexuais na Grécia ou Roma (pensemos na desavergonhada Pompeia). A felação não está documentada ainda - com a exceção de algum deus muito elástico que fazia em si mesmo -, apesar do querido Terenci.

Os egípcios eram, então, um povo pacato? “Ao contrário do clichê, acho que sim”, aponta Orriols. “Eram explícitos em textos sagrados, mas não, em geral, nos profanos. Se não existisse alguma espécie de tabu, a cópula apareceria representada graficamente, de forma mais abundante e oficial. Por exemplo, no contexto funerário.” A fama de atrevidos dos egípcios “vem das fontes clássicas greco-latinas que imaginaram o Oriente como um lugar de luxo e luxúria”. A propaganda romana contra Cleópatra, que a chamava de libertina, também contribuiu. “Os egípcios usavam pouca roupa pelo calor e a nudez é habitual na representação dos trabalhadores. Isso pode terminar sendo erótico para nós, mas certamente não era para eles. Acontece o mesmo com as transparências dos vestidos. Talvez a marcada sexualização das mulheres tinha algum significado relacionado com a fertilidade mais do que com o erotismo.” Tudo isso não quer dizer que para os egípcios, o sexo tivesse conotações pecaminosas no sentido judaico-cristão. O ato sexual com penetração - transar, quer dizer - não apresentava, segundo explica Lynn Meskell em seu estupendo Private life in New Kingdom Egypt (2002) nenhuma conotação, nem positiva nem negativa. Era chamado de nk. Então este era o termo, para continuar procurando.

O prazer do cara de pau (Arnaldo Jabor)


“Tudo bem, caro jornalista... vou fazer umas confissões não digo políticas, mas existenciais. E tudo ‘off the record’, tá legal? Bem, digo-lhe que estou horrorizado com a hipocrisia reinante, quando todos negam o que sempre fizeram. Eu nunca reneguei minhas posições, digamos, estelionatárias. Para mim, nunca foi um defeito ou motivo de vergonha; sempre foi um grande prazer – chamemos de vocação. Por isso, vou me vingar da grossura que vejo no mundo da fraude clássica. Faltam à maioria dos ladrões elegância e ‘finesse’. Roubam por rancor, roubam o que lhes aparece na frente, se acham no direito de se vingar de passadas humilhações, mãe lavadeira, dores de corno, porradas na cara não revidadas.

Eu, não. Eu sou cordial, um cavalheiro; tenho paciência e sabedoria, comecei pouco a pouco, como as galinhas que roubei na infância, que de grão em grão enchiam o papo... Ha-ha-ha ...


Hoje, já estou bem de vida graças a Deus e posso aprofundar para você o que nos move à corrupção. Como bem observou o grande historiador Evaldo Cabral de Melo: mais do que afirmaram Sergio Buarque, Freire e Faoro, a incompetência e a corrupção são o que trava o pais há séculos. Tenho orgulho de nosso passado, tenho tradição.

Muita gente acha que roubamos por ambição. Mas, além do amor à bufunfa, à grana, roubamos por puro prazer. Isso. Grandes prazeres nos movem. Já tenho sete fazendas reais e sete imaginárias, mando em cidades do Nordeste, tenho tudo, mas sou viciado na deliciosa adrenalina que me arde no sangue na hora em que a mala preta voa em minha direção, cheia de dólares.

Vibro de alegria quando vejo os olhos indignados e envergonhados dos empresários me pagando a propina, suas mãos trêmulas me passando o tutu. Deleito-me quando o juiz me dá ganho de causa, ostentando honestidade, e finge não perceber minha piscadela marota na hora da liminar comprada. Sinto-me superior; adoro flutuar acima dos otários que me ‘compram’, eles se humilhando em vez de mim.

Roubar dá tesão; me liberta. Eu explico: roubar me tira do mundo dos ‘obedientes’ e me provoca quase um orgasmo quando embolso uma bolada. É um barato rolar nu sobre notas de US$ 100 na cama, comendo chocolatinhos do frigobar de um hotel vagabundo na cidade onde superfaturei uma rede de esgotos. Adoro ver o espanto de uma prostituta quando eu lhe arrojo US$ 1.000 entre as coxas e sinto sua gratidão nas carícias mais perversas.

Tenho prazer de ostentar dignidade em CPIs; sou ótimo ator e especialista em amnésias políticas. Tenho o grande prazer de usar palavras nobres em minhas negações: ‘Nego! Não admito aleivosias, patranhas assacadas contra minha honra ilibada, minha vida sem jaça’. E solto brados de honradez, socos nas mesas, babas indignadas, hipócritas lágrimas de esguicho e clamores a Deus. Sei dizer muito bem, melhor até que nosso guia Lula, que nunca soube de nada de nada... Já declarei de testa alta na Câmara: ‘Não sei como esses milhões de dólares apareceram em minha conta na Suíça se eu nem tenho conta lá!’ O venerável Maluf criou uma escola. Esse grau de mentira deixa de ser mentira e vira uma arte.

Tenho o prazer de ficar indiferente aos xingamentos da mídia... É o que chamo de ‘prazer da cara de pau’. Aliás, minha cara é de ‘pau-brasil’ em homenagem ao nosso passado.

E a doce volúpia de ostentar seriedade em salões de ‘homens de bem’ que me xingam pelas costas, mas me invejam secretamente pela liberdade cínica que me habita? Sou olhado com admiração nas churrascarias entre picanhas e chuletas, e suas mulheres me olham com volúpia, imaginando os milhões que amealhei.

Sinto prazer vendo os puxa-sacos que me lambem com olhos trêmulos e mãos frias de medo e reverência.

Adoro ver a palidez de guardas e contínuos diante de minha arrogância, quando lhes mostro a carteira do Senado. Até me satisfazem pequenas alegrias parlamentares, como usar um jaquetão igual ao do Sarney, feito de ‘teflon’, onde nada cola. Com bom humor fraternal participo do visual de meus colegas, pintando os cabelos de acaju ou preto-nanquim.

E o prazer de levar uma vida aventurosa, secreta. Nada da chatice terrível dos honestos, pois sabemos que virtude dá úlcera. Adoro os jantares nordestinos, com moquecas e maracutaias, amo as cotoveladas cúmplices quando se liberam verbas, os cálidos abraços, os sussurros segredados nas varandas das máfias rurais.

Tenho orgulho do mal; pois, como dizia minha avó, há males que vêm para o bem. Explico-lhe, amigo: eu e meus pares temos provocado uma indignação na opinião pública que ajuda a mudar o país – nós somos o ‘mal’ que traz o ‘bem’. Eu só tenho inveja da maneira petista de mentir. Eles não sentem culpa de nada, pois roubaram em nome do ‘povo’. Eles são o ‘bem’ que vem para o ‘mal’.
Me dá um grande prazer minha respeitabilidade altaneira que confunde meus inimigos, na dúvida se eu tenho mesmo grandeza acima dos homens comuns. Posso, do alto de meu cinismo transcendental, ter até a coragem de ser covarde. Levo desaforo para casa, sim, dou beijos de Judas, sei dar abraços de tamanduá e chorar lágrimas de crocodilo... No fundo, eu me acho mesmo especial; não sou comum.

Sou profissional e didático... Eu me considero um Gilberto Freyre da escrotidão brasileira. Eu estou no lugar da verdade. Este país foi feito assim, na vala entre o público e o privado. Há uma grandeza insuspeitada na apropriação indébita, florescem ricos cogumelos na lama das roubalheiras... Tenho orgulho de ser um dos fundadores de uma nova ciência: a ‘canalhogia’ ou talvez a ‘filha-daputice’.
É isso, tenho o prazer de não ser nem de esquerda, nem de direita, tenho o prazer de não ser porra nenhuma. Aliás, todos esses picaretas ideológicos também não são nada. Meu partido sou eu mesmo presidente e militante. Vivo feliz com a grande delícia de minha corrupção assumida. Eu sou antes de tudo um forte.”

segunda-feira, 1 de junho de 2015

O besteirol de Dilma sobre incas, maias, astecas, olmecas e toltecas (Augusto Nunes)

Augusto Nunes publicou o comentário abaixo a propósito de entrevista dada por dona Dilma ao jornal mexicano La Jornada. O transcrito das falas da madame e do jornalista é espantoso. Redime o ex-presidente Figueiredo. A obtusa dama faz o velho general parecer um membro destacado da Academia Brasileira de Letras. 

......................................................................................................

"O besteirol de Dilma sobre incas, astecas, olmecas, maias, toltecas e espanhóis confirma que os idiotas estão po toda parte. E governam o Brasil há mais de 12 anos.

Já na abertura da histórica entrevista ao La Jornada, Dilma Rousseff mostrou que a memória do neurônio solitário conseguiu piorar: não sabia direito quantas vezes estivera no México, confessou. Lembrava-se de duas. Mas podem ter sido três. Ou 200, sugeriu a catarata de maluquices despejadas pela presidente nos 70 minutos seguintes.

A íntegra da entrevista, transcrita pelo Portal do Planalto, tem mais de 8 mil palavras. Como La Jornada publicou menos de mil, cuidadosamente maquiadas pelos editores, os mexicanos continuam sem saber que a presidente do Brasil é capaz de nada dizer de aproveitável sobre rigorosamente tudo. Civilizações esmagadas pelos dominadores espanhóis, por exemplo.

Dilma resolveu chapinhar na areia movediça quando discorria sobre a forte impressão que lhe causara a contemplação de ruínas astecas. Leiam a transcrição oficial da conversa:

Presidente: A mesma coisa o Inca, não é? Mas lá é mais, era mais avançada, a mais avançada de todas. E não era Asteca, não é? Eles não sabem, eles chamam de tolteca, olmeca.

JornalistaMaia.

Presidenta: A Maia é mais embaixo, é ali na península do Yucatán, não é?

Jornalista: Isso.

PresidentaMas a do centro do México, ali, ali na…

JornalistaEssa é Asteca.

Presidenta: Essa é Asteca? Não é Tolteca, não é… Porque...

JornalistaNão, Tolteca é mais…

Presidenta: Não, me diz o seguinte: as duas pirâmides não são astecas?

JornalistaNão, totalmente, não. Mas eu também não sou expert em…

Presidenta: São… Segundo… Por exemplo, eu fiquei estarrecida, então corri atrás para saber. Segundo se sabe, é de uma civilização anterior.

JornalistaAnterior, claro.

Presidenta: Anterior.

JornalistaQue os Astecas dominaram pela sua vez.

Presidenta: Que os Astecas dominaram.

JornalistaExatamente.

Presidenta: Porque os Astecas, eles dominaram civilizações que tinham em torno. 
Inclusive isso explica, em parte, a questão de eles terem, dos espanhóis terem conquistado ali, a cidade do México, e aplastado, porque aplastaram.

JornalistaTanto que na praça central no Zócalo…

PresidentaÉ, eu sei, tem… Eu sei disso, que lá no Zócalo, estive lá no Zócalo. Quem é que… Você vai lá, o Zócalo é uma praça monstruosa, não é?

JornalistaEmbaixo tem templos astecas.

Presidenta: Tem, e tem um debaixo da catedral.

JornalistaExatamente.

Presidenta: Exatamente debaixo da catedral. Uma forma de você desaparecer com a civilização, não é?


Nelson Rodrigues constatou no século passado que os idiotas estão por toda parte. Como informa a leitura da entrevista, infestam também o jornalismo mexicano. E governam o Brasil há mais de 12 anos".

Ah, dona Dilma está, como sempre, estarrecida com alguma coisa. Nós também.