quinta-feira, 20 de maio de 2010

Lei de Gérson

(Extraído de SUPERINTERESSANTE)

"Viva a lei de Gérson!


O meio-campista Gérson ficou célebre não apenas por ter sido uma das maiores estrelas do tricampeonato brasileiro em 1970, mas por ter formulado, na propaganda do cigarro Vila Rica veiculada anos depois, aquela que viria a ser conhecida como lei de Gérson: "O importante é levar vantagem em tudo, certo?" - frase dita num carregado sotaque carioca, forçando os erres até o palato ficar encharcado. Gérson tentou por muito tempo se desvencilhar da fama de patrocinador dos espertalhões, patrono dos corruptos e propagandista dos canalhas, mas não teve jeito.

A lei de Gérson pegou. Sociólogos, antropólogos e a nata da intelectualidade brasileira já gastaram horas e mais horas, tinta e mais tinta, neurônios e mais neurônios para condenar nossa brasileira condição gersoniana. Somos mesmo uma nação de egoístas, corruptos e sacanas, que só pensam em si e só querem saber de levar vantagem. Certo?

Errado. No fundo, Gérson deveria ter é orgulho. Só a lei de Gérson nos salva nesta era politicamente correta, em que anão virou "verticalmente prejudicado", pobre virou "excluído social", débil mental virou "diferentemente capacitado" e em que nem propaganda de cigarro é mais possível fazer sem pedir desculpas em letras garrafais. O enunciado da lei de Gérson põe a nu a essência do nosso caráter sem pudor: somos um povo que gosta de levar vantagem. E daí? Alguém aí teria orgulho de fazer parte de uma nação de trouxas e otários?

Ninguém aqui vai defender um comportamento antiético ou ilegal com base no enunciado da lei de Gérson. Se ela existe, é em primeiro lugar reflexo da nossa realidade. Veja o caso das nossas empresas. Na hora de dar entrevista e aparecer na mídia, todas querem loas a sua responsabilidade social corporativa e boa cidadania. Na hora de declarar imposto, de desempatar alguma pendenga judicial ou de conseguir autorização para obras, estão todas atrás do primeiro Rocha Mattos de plantão para livrar-lhes a cara, já que, em meio à nossa barafunda legal, a propina é questão de sobrevivência e só ela faz a economia andar.

Parece que o povo brasileiro vive uma tensão entre duas forças. Por fora, a força da imagem. Em público, todos têm de ser como que sacerdotes, com comportamento impecável, retidão moral absoluta, espinha dorsal inflexível. Os políticos corruptos são condenados com virulência, qualquer deslize de executivos tem de ser punido de forma exemplar, damos a nossos filhos a impressão de que a ira divina se abaterá sobre suas menores falhas. Esse sentimento faz a fortuna e a desgraça de prefeitos, governadores e presidentes.

Por dentro, porém, irrompe a força de Gérson. Ninguém agüenta essa pressão hipócrita. Todos querem o melhor para si - e que mal há de haver nisso? De posse da menor fímbria de poder, de uma tênue nesga de oportunidade, não raro transgredimos as mesmíssimas regras cuja transgressão acabamos de condenar nos outros. Julgamos, condenamos, enforcamos e esquartejamos Gérson. Mas Gérson somos nós. Eis nosso dilema.

Para que tanta hipocrisia? Nada disso precisa ser assim. A lei de Gérson muito deveria nos honrar. Basta despi-la da hipocrisia para perceber que é a esperteza nacional que faz o Brasil se destacar em meio à mediocridade reinante no planeta politicamente correto, em que tudo tem de ser igual e insosso, em que todos acham que têm direito a tudo, em que a criatividade - e a verdadeira diferença - foram banidas.

Na América Latina, os argentinos choram suas tristezas frustradas num tango melancólico, enquanto nós brasileiros damos risadas de nossas sacanagens num alegre sambinha. Qual o problema se podemos ser espertos e felizes? Quem disse que ser esperto é ruim ou necessariamente antiético? Por que ter vergonha disso em vez de usar a esperteza a nosso favor?O empreendedorismo e a criatividade do brasileiro nada mais são que expressões dessa faceta mais nobre da lei de Gérson.

Afinal, empreender não é saber aproveitar oportunidades? Criar não é violar regras estabelecidas e preconcebidas? Tudo isso não é, no fundo, saber levar vantagem? Vamos largar a mão de ser bestas e incorporar com orgulho nosso lado Macunaíma. Vamos dar um basta à histeria politicamente correta que infesta a humanidade e usar nosso próprio antídoto: a boa e velha lei de Gérson. Viva Macunaíma! Viva Gérson! Ziriguidum. Telecoteco. Balacobaco, esquindô, esquindô."

Sherit Hapleitá (Floriano Pesaro)

(Discurso de Floriano Pesaro discursa na sessão soleneem recordação aos heróis e mártiresda II Guerra Mundial)

"Nós todos, que hoje advogamos pela memória da tragédia do Holocausto como alerta para o futuro, devemos nossa inspiração à Associação dos Sobreviventes Israelitas da Perseguição Nazista – O Sherit Hapleita.

Já no vislumbre de um possível fim do Holocausto, os sobreviventes da barbárie buscaram um caminho para o povo judeu. Inspirando-se nada menos do que na Bíblia - o nome Sherit Hapleita tem origem no primeiro livro de Crônicas 4:43 - essas pessoas, provas vivas da capacidade humana de sofrimento e superação, começaram a se organizar social e politicamente, já que o colapso nazista os deixara sem família, sem lar, sem país, sem perspectiva.

Recusando a segregação e a desumanidade dos Campos de Pessoas Deslocadas, recusando o aviltamento de terem que sair de “Dachau para Feldafing”, os corajosos cidadãos do Sherit Hapleita, rejeitaram definitivamente serem mais uma vez tutelados e ignorados.

Tendo como fator primordial de convergência o mesmo fato que os levou à beira do extermínio (ser judeu), a organização foi pioneira em determinar linhas de ação para que o povo judeu pudesse ter voz, compensação, memória, país e autodeterminação.

Já em sua primeira conferência, os delegados de Sherit Hapleitá decidiram sobre um programa de 14 pontos em que estabeleciam um amplo mandato, incluindo o estabelecimento de um estado Judeu na Palestina, com reconhecimento pelas Nações Unidas, compensação para as vítimas do nazismo, participação nos julgamentos contra os criminosos de guerra nazistas, um arquivo de registros históricos e ampla autonomia.

Hoje, somos milhões em Israel e no mundo afora, livres, confiantes, orgulhosos por termos uma terra para chamar de nossa. Mas devemos isso à coragem e esperança destes heróis sobreviventes que reafirmaram um dos fundamentos de nosso povo: a valorização da vida acima de tudo. Heróis que entenderam o perigo de subserviência, heróis rotos, machucados, sofridos, enlutados. Uma massa de seres humanos distintos em suas crenças políticas, sociais e mesmo em seus graus de crença.Mas heróis que sumarizam a inestimável citação do sábio rabino Hilel:

" IM EIN ANI LI MI LI"

(Se eu não for por mim, quem será por mim? E se eu cuido só de mim, quem sou, afinal? E se não agora, quando?)

Nosso agradecimento será eterno. Nosso caminho foi esboçado lá, no rescaldo das cinzas de nossos familiares. Foi lá que escolhemos renascer, foi lá que decidimos que nossa resposta a Hitler seria recordar, alertar, mas sobretudo: viver. Por isso hoje podemos dizer de boca cheia: AM ISRAEL HAI."

Os homens ou os sistemas políticos?

"A EXPERIÊNCIA FRUSTRANTE DE ACREDITAR MAIS UMA VEZ QUE O PROBLEMA SÃO OS HOMENS E NÃO OS SISTEMAS POLÍTICOS"! (Trechos do artigo de Jorge Fernández Díaz, no La Nacion)

1. Os homens, assim como os meninos, querem que contemos sempre a mesma história, e a arte consiste em fazer com que pareça sempre diferente. Vale a máxima de Oscar Wilde: "O único dever que temos para com a história é reescrevê-la”.

2. O mítico final de Júlio César só funciona hoje como uma simples metáfora para o declínio e derrota de um governante. Esclarecimento fundamental nesta era de má-fé, em que tudo é manipulado para o escárnio. Essa metáfora, explica que o que aconteceu em Roma em 15 de Março do ano 44 AC e tem conotações no presente: "Para a sociedade civil apresentava-se então, como se apresenta agora, se prefere a liberdade ou a segurança e a paz”.

3. O poder supremo de César foi o produto de um longo período de desintegração e caos que o havia precedido. A sociedade buscou um homem forte e, em seguida, começou a queixar-se quando esse líder providencial se perpetuou no poder e adotou as irritantes atitudes de um monarca.

4. No palácio, uma amante de César o surpreendeu em uma intimidade exausta e fatalista, e disse: "Quanto maior é o seu poder, maior a inveja; quanto maior é seu valor, maior é o ódio. É inevitável”. César sentia que não somente seus inimigos políticos preparavam sua queda, mas toda sociedade esperava, cansada e ansiosa, esse resultado. O resultado é conhecido: um grupo de "guerreiros da liberdade" esperam por Júlio César no Senado e o apunhalam, e depois saem à rua à procura de vivas e aplausos do povo.

5. Os eventos que seguem estas primeiras horas são ainda mais interessantes, já que contém uma inquietante lição política. O protagonista deste segundo momento - Marco António - não aceitou participar, mas tampouco denunciou os conspiradores. Ele era partidário do partido do poder. E fez imediatamente uma descoberta surpreendente: "Não sabem o que fazer. Não têm a menor idéia. Ninguém se preocupou em pensar o que iria acontecer depois". Ele estava se referindo aos "libertadores", como se nomearam.

6. O único projeto que tinham era substituir Júlio César, uma obsessão que não havia lhes permitido definir que rumo seria dado ao Império Romano. Marco Antonio triunfou naquele dia, já que era um cesarista prodigioso e contava com aparato e uma verdadeira vocação para o poder. Os resultados foram, no entanto, catastróficos: uma série de lutas e guerras internas irromperam, a República caiu em desgraça e foi substituída por uma variação da monarquia chamada principado, com uma figura monumental como Augusto e uma cadeia de césares ditatoriais culminando em Nero.

7. Mostra a inutilidade da derrubada de César e a seqüência de mal-entendidos e cegueira entre os líderes e governantes, os riscos de procurar o poder absoluto, a leviandade de quem quer o governo sem saber exatamente o que fazer com ele e a experiência frustrante de acreditar mais uma vez que o problema são os homens e não os sistemas políticos e as sociedades que os tenham parido. Está certo. O único dever que temos para com a história é reescrevê-la. Assim nos livros como na realidade."

(Extraído do ex-blog de Cesar Maia, em 20/05/2010)