Mariana Moura é candidata a vereadora em Belo Horizonte. A candidata parece se apoiar no famoso conto de Edgar Allan Poe (A carta roubada) para falar do quanto o óbvio é tão evidente que não consegue ser percebido. Seguem abaixo suas considerações:
"A maioria dos políticos brasileiros vive a proclamar – é quase um mantra
uníssono, samba de uma nota só – que pretendem obter um mandado popular para
poder “cuidar das pessoas”. O mesmo dizem, nas suas propagandas, os bancos, as
administradoras de planos de saúde, as fábricas de refrigerantes, as oficinas
mecânicas, os supermercados, as concessionárias de serviços públicos e os
governantes de qualquer nível, seja local, regional ou nacional. Enfim, todo um
vasto conjunto de empreendimentos e instituições proclamando, no período
eleitoral principalmente, que busca, nada mais nada menos, que uma oportunidade
de cuidar de cada um de nós.
A intenção proclamada, no entanto, costuma guardar enorme distância
daquilo que efetivamente é realizado. Os exemplos de tal dissonância são
inúmeros; podem ser apreciados em qualquer nível da administração pública: na
saúde, na educação e na mobilidade urbana numa constante praticamente
universal.
A prefeitura de Belo Horizonte, para focar apenas um único caso,
construiu dezenas de estações ao longo das avenidas Antônio Carlos, Pedro I e
Cristiano Machado, componentes do sistema denominado MOVE, com faixas
exclusivas de trânsito e pontos roteadores de transbordo. Deixemos de lado
eventuais problemas de logística, naturais na sua ocorrência, para ficarmos
atentos a um único ponto.
Os inventores do MOVE pensaram que o sistema adotado se destinava a
anjos. Anjos, conforme é sabido, não estão submetidos às injunções fisiológicas
dos seres humanos normais. Anjos, portanto, não possuem as triviais
necessidades que obrigam os homens e mulheres (principalmente estas), de ir,
eventualmente, ao banheiro.
Gastaram uma fortuna para construir uma obra imensa
e se esqueceram de “cuidar” dos usuários que buscam se locomover pela cidade.
Não levaram em conta que grávidas, idosos, cadeirantes e outros fragilizados
fazem xixi e cocô e os bebês precisam trocar as fraldas periodicamente. Mas
Belo Horizonte, pelo que se sabe, possui pouquíssimos banheiros públicos
decentes (com fraldário, então, nem pensar).
A prefeitura perdeu, assim, uma ótima oportunidade de matar vários
coelhos de uma só cajadada, quando investiu incontáveis milhões no MOVE,
imaginando que os usuários seriam anjos que, aliás, quando se deslocam o fazem
pelo ar, voando. Não precisam do MOVE nem do metrô. Tal desleixo arrogante
atinge, em especial, as mulheres. Os homens, dada sua anatomia, podem com menores
riscos lançar mão dos banheiros infectos dos botequins espalhados pela cidade.
A pergunta óbvia que não quer calar é: onde estão aqueles que alardeiam
querer “cuidar” das pessoas? Os que se querem nossos cuidadores não têm uma
resposta para questões tão singelas e úteis. O código de posturas urbanas de
Belo Horizonte não poderia prever a obrigatoriedade de existência de banheiros
públicos, em todas as estações de embarque e desembarque de passageiros?"
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