quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Dória e Kalil: empresário e empreiteiro


Em determinadas circunstâncias históricas, quando se conjugam crises espiritual, política, econômica e social, aparecem aventureiros e inovadores buscando ocupar o proscênio conturbado. É o campo perfeito para aqueles que se dizem portadores da boa nova, com uma abordagem em tudo diferente de "tudo isso que está aí". Nestas eleições municipais, como não poderia deixar de ser, pululam os candidatos a prefeito que, enchendo as bochechas, não se cansam de se apresentar travestidos da roupagem do "novo". Alguns, provavelmente o são; outros, ao contrário, não passam de barrocas imitações; parecem, mas não são.

João Dória, prefeito eleito de São Paulo, é um empresário de verdade que expressou em sua campanha o compromisso com valores caros ao mundo contemporâneo. Tudo que disse e prometeu estava alicerçado numa história pessoal e empresarial coerentes com suas pregações. 

Elias Kalil, candidato e prefeito de Belo Horizonte, ao contrário do paulista, escolheu o nicho da antipolítica no seu aspecto mais primário, brandindo toscamente bordão de ódio e desprezo aos políticos em geral: "chega de político; agora é Kalil". Kalil, diferentemente de Dória, não é empresário. Ele é, apenas, mais um daqueles seus iguais que emporcalharam a vida nacional - os Odebrecht, os Andrade Gutierrez, os Camargos Correias etc. - para ficar apenas nos mais notórios, sem esquecer outros tantos empreiteiros que pululam em todo o país, de diferentes tamanhos e propósitos negociais, todos porém em íntima associação de natureza oligopólica. Cada macaco em seu galho, e todos juntos e irmanados beliscam sua parte no butim. 

Empreiteiros, conforme se sabe, são o braço operativo do estado. Atuam, sem qualquer dificuldade, para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Mereciam, a bem da verdade, um ministério todo seu: o ministério das empreiteiras, a se desdobrar, pelo princípio da simetria, em secretarias estaduais e municipais com o mesmo objeto. Sendo parte orgânica da administração pública, os empreiteiros fazem e desfazem, comandando decisões e subornando os políticos visando alcançar seus objetivos pecuniários. Empreiteiros não se subordinam à política. O contrário, sim, é que é a verdade. 

Tendo tal poder e tal inserção social, os empreiteiros jamais sofrem baques em seus negócios. Sua fonte de sustentação não é o mercado, tal como entendido costumeiramente. Apoiam-se no erário e inventam medidas e maneiras para manter um fluxo de caixa que lhes seja sempre favorável. Para azeitar seus recebimentos, untam os canais costumeiros, nascendo daí a corrupção institucionalizada ou, como diria Dante, "do não fazem sim pela propina".

Kalil, o candidato a prefeito de Belo Horizonte, dá um passo adiante nesse complexo jogo entre empreiteiros e a política. Mais ousado é o movimento quando se sabe, ou pelo que se divulga, ser ele um empreiteiro falido, com contas a acertar com o fisco municipal. Mais curioso, ainda, é seu suporte organizacional, construído em torno de pequenos partidos de esquerda - PHS, PV e Rede Solidariedade - com o velado apoio do PT e seus sequazes, como o PC do B e outros menos votados. Espantoso bloco de poder, que nem um Gramsci conseguiria decifrar. Esses partidecos se movimentam, e remoem, gulosamente, à espreita das boquinhas volumosas da prefeitura, caso obtenham a vitória no próximo dia 30 de outubro, tendo Kalil como aríete a arrombar as portas.       

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