quarta-feira, 20 de julho de 2016

CONTRA FATOS NÃO HÁ ARGUMENTOS (João Berchmans C. Serra)


Nos últimos tempos, o país experimentou uma profusão de escândalos atingindo diretamente os mais diversos órgãos e empresas do governo federal, que revelam os desmandos cometidos por Dilma Rousseff. 

O envolvimento da presidente afastada provisoriamente por decisão do Senado Federal se apresenta tão manifesto que é difícil, senão impossível, negar a evidência dos fatos, independentemente de ela ter, ou não, obtido vantagens financeiras pessoais. 

Daí o processo de impeachment de conteúdo jurídico-político, que se presta a definir se a presidente afastada cometeu o crime de responsabilidade ao editar decretos que abriram créditos suplementares para o Poder Executivo a realizar gastos exorbitantes sem a prévia autorização do Congresso Nacional e, ainda, se a presidente Dilma violou a lei de responsabilidade fiscal ao lançar mão de empréstimos ilegais obtidos “artificiosamente” junto ao Banco do Brasil, do qual a União é o acionista controlador. 

Os fatos são claros e assinalam, na apuração honesta que se faz, a feição gravíssima da prática, a um só tempo, da fraude contábil e fiscal de natureza grave, assim caracterizando-se, plenamente, o crime de responsabilidade. Com efeito, a nenhuma outra conclusão pode-se chegar, senão a de que se trata de uma sequência de transgressões conscientemente consumadas pela presidente afastada, não havendo como fugir da conclusão legal e imperiosa de que seu afastamento definitivo se torne imediato. 

Em sua defesa, a presidente afastada nega ter cometido o delito que lhe é imputado e atribui aos seus subordinados a culpa pela prática das irregularidades, como se fosse razoável a um presidente da república ignorar, por exemplo, que o seu governo pedalou em cerca de R$ 60 - 2/6 - bilhões de empréstimos forçados e inadimplidos, recorrentemente junto ao Banco do Brasil, a ponto de gerar quase R$ 1.6 bilhão em remuneração de juros e atualização monetária, dado que o custo de oportunidade do BB teve que ser pago. 

Não obstante essa irrefutável constatação, insiste a presidente afastada em defender a prática rasteira adotada, dizendo-a não passível de enquadramento no conceito de operações de crédito ou a estas assemelhadas e tudo por não haver um prazo assinalado pelo BB para que realizasse a “liquidação” da dívida. 

Pobre do cidadão comum que, inadimplente frente a um banco qualquer, se valesse desse argumento... Mas Dilma Rousseff, que tanto viajou mundo afora, deveria retornar no tempo, indo até a Roma antiga, berço do direito que inspirou a civilização ocidental, onde se cunhou a locução “in re ipsa”, com ela querendo dizer os romanos que uma coisa, de tão óbvia, fala por si só. 

Os romanos não perdiam tempo quando os fatos eram evidentes. O direito brasileiro, como de resto o dos demais países do mundo civilizado, ditou que o fato notório dispensa prova e teceu o jargão de que contra fatos não há argumentos. Quando os fatos falam por si, a presunção é no sentido de que as evidências são verdadeiras até prova em contrário. 

O princípio do in re ipsa já seria suficiente para determinar a dispensa definitiva da presidente afastada Dilma Rousseff, tamanha a clareza dos fatos acerca da gravíssima prática de crime de responsabilidade. 

Gravíssimos foram efetivamente os atos por ela conscientemente consumados no exercício da presidência. Além de manifestação incontestável do TCU, a perícia feita a pedido da própria defesa de Dilma Rousseff concluiu que ela praticou ato comissivo irregular e típico do crime de responsabilidade na edição de decretos de créditos suplementares. 

Consta ainda dos autos do processo de impeachment manifestação técnica conclusiva da assistente dos - 3/6 - peritos no sentido de que as pedaladas efetivamente ocorreram e se deram, também, no firme propósito de o governo de Dilma Rousseff esconder os exorbitantes gastos feitos ao arrepio da lei de responsabilidade fiscal, configurando o que a maioria esmagadora dos senadores hoje chama de “o conjunto da obra”. 

Mas a presidente Dilma, que já havia corrompido a língua portuguesa ao cunhar um substantivo inexistente - o inoportuno e inconveniente “Presidenta” - tentou igualmente forjar um neologismo contábil para escriturar as pedaladas como sendo um alongamento da equalização de créditos a receber (vide balanço do Banco do Brasil de 2015). 

Mais do que isso, a presidente afastada usurpou a competência de um outro poder ao agir conscientemente para editar decretos que autorizavam gastos suplementares sem a outorga uxória do Congresso Nacional. A coisa fala por si só, mas Dilma Rousseff ainda tenta provar que tudo era feito sem a sua participação direta, como se fosse crível imaginar que, de repente e ao mesmo tempo, sem que existisse um comando central superior, um sem número de servidores públicos do Ministério da Fazenda, da Secretaria do Tesouro Nacional, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, do Banco Central e do BNDES, dentre outros, tivessem agido à revelia de uma presidente marcadamente autoritária e centralizadora, como sempre foi Dilma Rousseff. 

Não paira a menor sombra de dúvida: a lamentável fraude contábil-fiscal devastadora da economia do país, empreendida sob título de contabilidade criativa, contou com o apoio direto da presidente afastada e fácil é de se ver, bem à mostra, nesse ato ardiloso, o propósito de validar o estelionato eleitoral cometido em 2014. 

Hoje, ninguém duvida que a presidente Dilma àquela época bem sabia que jamais seria reeleita se a sociedade brasileira tivesse uma remota noção do verdadeiro tamanho do fosso que ela e os mais destacados colaboradores do seu partido cavaram, agindo como prepostos e mandatários da presidente afastada. 

Mas o projeto de poder traçado para durar pelo menos 30 anos foi catapultado pela sede com que alguns dos vassalos da presidente afastada se lambuzaram com o mel da onipotência que o dinheiro fácil traz e com o fel da corrupção. 

Como acreditar na tese da defesa que diz não ter havido crime de responsabilidade se, como se sabe, a Constituição Federal prescreve uma forma a ser seguida por quem exerça a presidência da república, no caso a presidente Dilma ? 

Não será absurda essa afirmação de suposta isenção do crime de responsabilidade, se a presidente afastada, passando por cima das disposições constitucionais, por prepotência e vaidade, para não dizer por abuso de autoridade, ordenou gastos suplementares sem autorização prévia do Congresso Nacional e escondeu deste Poder a verdadeira razão pela qual os gastos extraordinários seriam feitos? 

Como dizer não ter havido crime por violação da lei de responsabilidade fiscal se a presidente Dilma lançou mão de dinheiro de um banco controlado pelo governo federal para fazer frente às despesas do que se chamou “bolsa-empresário” e que já se viu ser de destinação criminosa? 

Como acolher a tese que diz ter a presidente Dilma praticado apenas atos de mera gestão administrativa, querendo fazer crer que a presidente afastada se limitava a chancelar os atos administrativos que os seus subalternos lhe submetiam, para assinatura, como se a atuação de Dilma ao validar gastos superiores a R$ 60 bilhões fosse uma questão meramente pró forma?!

In re ipsa, diriam os romanos e dizemos nós, brasileiros e brasileiras que, cansados de tanto desmando, fomos às ruas e ganhamos as praças públicas para exercer o nosso civismo e defender a Constituição Cidadã. Não é razoável querer convencer que Dilma Rousseff nada sabia ao praticar atos privativos de um presidente da república! 

Culpar apenas os seus subordinados, um deles o grande mentor e executor dessa contabilidade destrutiva e seu fiel escudeiro desde os tempos em que Dilma trabalhou para o governo do estado do Rio Grande do Sul, é fazer pouco caso do senso comum. 

Dilma Rousseff teve a chance de prestar depoimento na Comissão Especial do Impeachment e, mais uma vez, ignorou o Senado Federal valendo-se, como sempre fez, de terceiros para a prática de seus atos. É sintomático que ela, na condição de ré, acusada de graves crimes evidenciados por fatos notórios, tenha agido como sempre fez: deixou para terceiros a tarefa de falar e fazer por ela atos que o cidadão comum pratica pessoalmente. 

A sua ausência no depoimento pessoal, tarefa a rigor inderrogável, fazendo-se representar por seu advogado é a prova cabal de que a presidente afastada sempre praticou atos que lhes são próprios por meio de terceiros que em seu nome agem. Muito apropriados são os clássicos versos do célebre poeta baiano, Gregório de Matos, conhecido como “Boca do Inferno”, em que dizia: “O todo sem a parte não é todo, a parte sem o todo não é parte”. 

Dilma Rousseff, mais do que parte, era o todo nessa engenharia contábil-eleitoral criada para manter um projeto de governo que se mostrou desastroso para o país e que serviu apenas a uns poucos aproveitadores criminosos, hoje em boa hora conhecidos por força da Operação Lava-Jato que tantos e bons serviços presta à população brasileira. 

Dizer que Dilma Rousseff não sabia do ardil engendrado por seus colaboradores mais diretos faz-nos lembrar a crença pueril que Gilbert Keith Chesterton, o grande poeta e filósofo inglês, frisava no final do século XIX ao dizer que alguns ainda alimentavam a crença de que “são as árvores que causam o vento.” 

E tomando por empréstimo essa metáfora secular, pode-se afirmar sem temor que não foram os “quebra-galhos” da presidente afastada a causa dos ventos que assolam os 13 milhões de desempregados, que geraram um rombo histórico nas contas públicas e que determinaram uma queda vertiginosa da economia nacional hoje, felizmente, já com alguns leves sinais de recuperação. 

Toda a causa dessa tormenta, toda essa ventania devastadora é fruto direto de atos comissivos praticados por Dilma Rousseff que deixou para o Congresso Nacional a tarefa indeclinável de gritar pelo voto favorável ao impeachment, considerada a atitude afrontosa da presidente afastada para com o estado democrático de direito. 

Ao cometer o crime de responsabilidade, a presidente como que depôs o traje de gala de guardiã da pátria e revestiu-se das vestes usadas pelos que não se comportam bem diante da lei. Já posso ouvir o rumor dos passos do povo nas ruas cantando com Ivan Lins: “Abram alas pra minha bandeira [a verde-amarela do Brasil] já está chegando a hora”.

Nenhum comentário: