domingo, 11 de julho de 2010

Brechó político

As campanhas eleitorais costumam exibir um curioso fenômeno: em todas elas os partidos tradicionais se revestem dos mesmos surrados discursos sobre suas propostas de governo. Retiram as lorotas do fundo do armário, qual um paletó velho e fora de moda, calçam sandálias da humildade e saem pelo mundo em franciscana pregação de virtude e de apego ao “social” e ao “econômico” politicamente corretos. Coerentemente com as idéias encarquilhadas apresentam candidatos que parecem saídos de algum brechó de personalidades (alguns lembram figurantes de filmes de terror).
Não que a experiência de varões encanecidos deva ser desprezada, muito antes pelo contrário. Em momentos de crise foram homens mais que maduros que lideraram a condução de seus povos no enfrentamento de adversidades marcantes. No início da segunda grande guerra Churchill, por exemplo, prometeu aos britânicos apenas “sangue, suor e lágrimas”. Quanta diferença em relação ao que vemos no Brasil atual! Em vez de enfrentar os graves desafios postos à sociedade, as forças da mesmice se encharcam de promessas demagógicas acenando com a expectativa de casa, comida e roupa lavada para todos.

Os mineiros podem recuperar, em outubro próximo, o fio da história que os ligam aos primórdios de sua formação. A Conjuração Mineira, marco inicial, representou bem a resistência contra a opressão da Coroa portuguesa. A justa rebelião se fez ativada pelo inconformismo com a cobrança de 20% sobre as rendas dos mineradores. Tiradentes, hoje, talvez se suicidasse desesperado - antes de ser enforcado - se soubesse que nosso povo é subtraído de 40% dos seus ganhos, em favor de governantes mais preocupados com benesses e mordomias que atender ao interesse público.
Relembremos a Páscoa, festa maior da tradição judaico-cristã. Sua gênese está na rebelião dos hebreus contra a extorsão dos cobradores de impostos a soldo dos Faraós. Naqueles bíblicos tempos o povo de Deus ainda pôde fugir para a Terra Prometida. Hoje, no entanto, não há para onde ir. A resistência aos desatinos dos governos precisa começar, então, aqui e agora. Há que se favorecer a sociedade, reduzindo drasticamente o furor tributário do governo.
Imaginar que burocratas sabem, mais que as próprias pessoas, o que é melhor para elas é ignorar o fracasso das escolas públicas, a ruindade dos serviços de saúde, a precariedade do transporte coletivo, os cotidianos atentados à segurança, os graves danos ambientais etc. O cidadão paga seus impostos e pouco recebe em troca. Tem, aliás, que pagar duplamente: planos de saúde, matrícula em escolas privadas, contratação de empresas de segurança etc. A discussão de pontos como estes acima deixaria mais arejado o mundo que muitos estão a sonhar. (Publicado no jornal O Tempo, em 12/07/2010)

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