Em 17 de fevereiro de 1997 o mundo ficou órfão de Darcy Ribeiro. São, portanto, longos treze anos sem a presença física do mais audacioso dos educadores brasileiros. Darcy pensava grande e estimulava os outros a fazerem o mesmo (nem sempre com sucesso, diga-se a bem da verdade). Ele, porém, insistia em seu quixotismo, ancorado na mais profunda convicção que os homens podem ser melhorados. Darcy tinha clareza quanto ao instrumento para tal: a educação, em todos os seus níveis, do elementar ao superior. Discípulo fiel de Anísio Teixeira – a quem considerava seu mestre – foi um crítico feroz da desonestidade da escola oferecida ao homem comum do povo – essa triste, ineficaz e caríssima escola de turnos. Escola esta que, segundo ele, produzia mais analfabetos que alfabetizados, num paradoxo inaceitável para os verdadeiros patriotas. As diferentes elites, claro, sempre tiveram o cuidado de construir escolas para os seus ou, como costumam dizer, os “nossos” filhos; para os filhos dos miseráveis, entretanto, bastava qualquer arremedo de projeto educacional, pois, afinal, era uma escola para “eles”, para os “outros”, onde os felizes bem nascidos nunca iriam comparecer. Algo do tipo: para quem é, bacalhau basta. Ou para plagiar o título de conhecida canção brega: tá ruim mas tá bom! Estão aí, para os que têm olhos para ver, as denominadas "escola plural", "escola inclusiva", "escola candanga" e outras mais com adjetivos exóticos.
Critica-se o analfabetismo. Ele, no entanto, não é um mal em si. Em épocas já passadas, onde a cultura rústica ajustava o homem aos desafios do viver, não havia maiores problemas em não dominar a cultura letrada. O camponês analfabeto, por exemplo, sabia e podia sobreviver à perfeição no seu ambiente social e cultural. Nos dias de hoje, porém, quando o estilo de vida predominante é urbano, o conhecimento escolar se torna uma categoria central na existência de todos. Não compartilhar dos benefícios civilizatórios trazidos pelo domínio da leitura e da escrita é condenar os que dessas habilidades se encontram privados a viverem à margem de tudo como verdadeiros párias. Pois bem, os resultados da má obra de mesquinhas e sucessivas gerações estão aí, à vista de todos: dez milhões de iletrados adultos e dezenas de milhões de analfabetos funcionais. Eles são agravados pelos desatinos do mandarinato caboclo (e seus acólitos intelectualizados), que preferem adotar políticas compensatórias demagógicas, a propor e executar políticas educacionais universais decentes, como se faz e se fez em todo lugar do mundo. Um dinheirinho aqui, um favorzinho acolá, uma vaga comprada na rede privada superior para beneficiar, mais os "traficantes do conhecimento" que os supostos beneficiários, e chega-se à imagem que vai perpetuar a passagem pelo governo dos responsáveis pelos destinos atuais do povo brasileiro: um presidente da república, do alto de sua majestade, inaugurando uma ou outra creche, ou máquina de cortar salame, nas vastas periferias urbanas do país. Darcy sonhou mais alto!
Um comentário:
Há sonhadores que fazem mesmo muita falta...
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