segunda-feira, 31 de agosto de 2009

OS EXATORES DE FARAÓ (publicado em O Tempo, de 30/08/2009)

“Disse ainda o Senhor: Certamente vi a aflição do meu povo, que está no Egito, e ouvi o seu clamor por causa dos seus exatores. Conheço-lhe o sofrimento” (Êxodo, 3:7).

Curiosa passagem esta, contida na Bíblia. Relembremos alguns pontos. Os descendentes das doze tribos haviam se tornado uma multidão e se enriquecido prodigiosamente, em consonância com as promessas de D’us feitas a Abraão. Sob as bênçãos divinas o longo período de permanência naquelas paragens nilóticas (desde a migração de José e seus irmãos) gerou um quadro de grande prosperidade para o povo eleito. No entanto, esta riqueza passou a ser percebida como ameaça pelos potentados egípcios. Cabia, pois, por fim àquela situação. O instrumento usado para tal foi um que nos é tão familiar: a extorsão tributária. Os exatores, ou cobradores de impostos de Faraó passaram, então, a escorchar os hebreus. E o fizeram de tal modo que o Eterno se condoeu do Seu povo e incumbiu Moisés de promover a retirada pacífica dos espoliados. A dramaticidade desta saída do Egito foi tão importante para o futuro da civilização que a maior festa da tradição judaico-cristã – a Páscoa – tem ali suas raízes.

Em tempos mais modernos o furor arrecadatório também se fez presente à semelhança do caso egípcio. Meter a unha no povo é o esporte favorito dos governantes de todos os tempos e a reação contra tais absurdos costuma ser trágica. Os mineiros, por exemplo, conhecem bem as causas e os fatos da Conjuração Mineira, no século XVIII. A pretensão da Coroa Portuguesa de arrancar 20% dos ganhos obtidos na mineração detonou uma das rebeliões cívicas mais marcantes da nossa história (estes 20%, aliás, são uma ninharia se comparados com os quase 40% que o Estado brasileiro de hoje consegue expropriar dos que trabalham e produzem). Atualmente, há aqueles insensíveis em resistir à gula dos governantes (deputados, inclusive mineiros, que deveriam ser mais fiéis ao espírito libertário do Alferes), querendo recriar a famigerada CPMF, agora com outro nome de fantasia.

Mas os exatores contemporâneos, descendentes diretos daqueles patifes que serviam a Faraó, conseguem obter mais resultados que seus gulosos antepassados. Eles são muito mais criativos no que se refere a arrancar a pele de suas pobres vítimas ainda vivas, por suposto. Uma dessas formas (das mais eficientes), tem a ver com a criação de “cartórios” como é o caso daquele voltado para tudo que diz respeito à questão ambiental. Uma verdadeira parceria entre o público e o privado! Congrega uma teia de interesses cruzados de órgãos de governo, ONG’s e empresas de consultoria, todos ávidos em pelar o pato que ouse pensar produzir alguma coisa. Destilam então, do otário - formal ou informalmente - tributos variados, taxas, emolumentos e honorários, em dinheiro vivo ou em mimos e presentes compulsórios - computadores, veículos e outros adereços – numa ação coletiva própria de predadores bem articulados. Até quando, Senhor, suportaremos isto?

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