Em recente e momentosa
entrevista (concedida com o propósito de refutar a gigantesca massa de gente
que se levantou pelo Brasil afora contra ela, o PT e seu governo), dona Dilma
envelopou sua iracunda catadura com o adocicado véu da humildade. No entanto, ainda
pouco afeita aos gestos que marcam os primeiros passos para se chegar à
sabedoria, a velha senhora, recém-convertida à humildade, tropeçou algumas
vezes nas palavras. Compreensível. Neófitos em artes que lhes são por completo
estranhas, quando tentam se exercitar gaguejam, tropeçam, contradizem-se com
alguma frequência.
Dona Dilma, doravante a mais humilde entre os dirigentes
pátrios, se outorgou o admirável título, numa imitação barata de Stálin,
através de um ucasse definitivo e irrevogável, ao estilo do Gosplan. A
patacoada soaria como delírio inconsequente se não lembrasse as trapalhadas do
Chaves, não o facinoroso venezuelano, mas o encantador personagem mexicano
vivido por Roberto Bolaños.
Em um dos episódios da
comédia infantil, o professor Girafales conversa com um lacrimejante Chaves num
canto do pátio onde se desenrolam suas aventuras. O histriônico professor tenta
consolar o Chaves (que se lamentava por um erro qualquer que havia cometido), coisa
banal e sem maior importância, dizendo-lhe que todos erram alguma vez na vida.
Chaves retruca perguntado então se ele – o sábio mestre – também já havia
cometido algum erro. O professor Girafales, ao estilo premonitório de dona
Dilma, foi definitivo: “sim, Chaves, eu também já errei; errei pensando que
tinha errado”.
Dona Dilma, a humilde, ao
que parece, inspirou-se no burlesco professor Girafales para definir o novo
papel que pretende desempenhar. Provavelmente a madame só se lembrou dele, muito
popular desde os anos 70 do século passado. Outras referências não deveriam
estar disponíveis para escolha, certamente por absoluto desconhecimento e
impossibilidade histórica. Afinal, ela não teve muitas oportunidades de
conviver com gente que não fosse arrogante, autoritária, totalitária e
pernóstica.
Se na juventude ela aprendeu a dialogar portando uma metralhadora,
a compulsão à repetição (conforme alertava Freud), só poderia conduzi-la pelo
trilho que construiu ao caminhar, distribuindo pontapés e pescoções a torto e a
direito. Agora, dona Dilma proclama que está livre de repetir o hábito
perverso: tornou-se humilde e ai dos que discordarem. Na referida entrevista,
ponderou que ela talvez tenha se equivocado em alguma decisão de governo. Não
no mérito, frisou, porém na dose e na extensão, como se fora uma homeopata
distraída que se esqueceu de diluir suas beberagens, e apresentou ao doente o
veneno em sua forma pura.
A história apresenta a dona Dilma uma
surpreendente oportunidade de exercitar a força de sua humildade. Poderá
renunciar, como Collor. Não precisa ir ao limite de uma solução ao estilo
Vargas. O povo brasileiro é bom e generoso.
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