terça-feira, 30 de junho de 2015

Professores concursados não podem entrar em greve... na Alemanha (Leandro Narloch)


Para os alemães, é impensável professores concursados entrarem em greve. Eles franzem a testa quando você conta que em seu país é normal os professores ficarem três meses parados em protesto principalmente nos anos eleitorais. “Por que motivo fazem greve se são funcionários públicos?”, me perguntou uma professora alemã com cara de estranhamento. Respondi ainda mais surpreso: “justamente porque são funcionários públicos que fazem greve. É assim que negociam salários”.

A proibição de greve dos professores concursados foi a descoberta mais surpreendente que eu e outros seis latino-americanos fizemos ao conhecer o sistema educacional alemão. A convite do Instituto Friedrich Naumann, passamos a semana visitando escolas e conversando com professores, secretários de educação e políticos de Dusseldorf e Stuttgart.

O diretor de uma escola tentou explicar. Disse que a proibição de greve vinha desde o século 19 – durante as greves operárias da época, estabeleceu-se entre os reinos alemães que professores não teriam direito a esse protesto, para garantir a educação das crianças e permitir que os pais tivessem onde deixá-las ao irem para o trabalho. Os funcionários públicos abriram mão do direito de greve em troca da estabilidade, seguro médico acima da média, bom salário e boa aposentadoria. Achei a resposta fraca, mas juro aos leitores que foi a melhor que consegui arrancar por aqui. “Sempre foi assim”, me disseram.

As greves, porém, devem se tornar frequentes, pois há cada vez menos funcionários públicos como professores. Principalmente em Berlim e nos estados do Leste, os concursados estão sendo substituídos por profissionais em contrato temporário – que ganham menos, não têm estabilidade nem uma aposentadoria tão tranquila, mas podem entrar em greve. Em algumas cidades os professores concursados são menos de 20% do corpo docente.

Salários: um professor concursado, do equivalente ao Ensino Médio do Brasil, e no meio da carreira, tira 3400 euros por mês (1 euro = 3,50 reais). Descontando taxas e impostos, sobram 1800. Os contratados ganham pelo menos 1000 euros a menos no salário bruto. No estado de Baden-Wundenberg, o segundo mais rico depois da Baviera, um aluno custa ao governo em média 4600 euros por ano – ou 1300 reais por mês. Para as poucas escolas privadas do país (quase todas ligadas a fundações religiosas), o governo transfere 80% do valor que gasta com um aluno da rede pública.

A polêmica atual da educação alemã é a unificação das escolas. No sistema tradicional, aos 9 anos os alunos tomam três caminhos distintos. Aqueles que mostram mais habilidade para ciências e letras vão para o gymnasium, o caminho mais fácil para a faculdade. Os demais entram ou na realschule, que forma administradores e trabalhadores de escritório de nível médio, ou para a hauptschule, uma escola vocacional, para quem demostra vocação para ofícios manuais.

Hoje a maioria dos estados, com exceção da Baviera, permitem que o aluno e os pais tenham algum poder de escolher a escola que preferem. Mas até quatro ou cinco anos atrás era o professor que decidia o destino dos alunos. Como os pais querem ter um filho diplomado (e como as hauptschule têm uma péssima reputação de abrigar garotos-problema), uma gorda maioria está escolhendo o ginásio para os filhos, deixando vazios os outros dois tipos de escolas. O caminho deve ser a unificação – mas muitos alemães reclamam do risco de juntar alunos diferentes na mesma sala, nivelar por baixo e resultar em escolas de pior qualidade.

Vou embora considerando o sistema educacional alemão bom, caro e, principalmente, esquisito.

Nenhum comentário: